Cecílio e o broche perdido
Em 23 de agosto de 1941, há exatos 80 anos, enquanto o mundo queimava com a IIª Guerra Mundial, o senhor João Predebon e sua esposa passeavam pela cidade de Charqueadas, vindos de Canoas. No peito, a dama trazia um grande broche de platina cravejado de brilhantes, do tamanho de um punho fechado, conforme contava a pequena Otília, esposa de Cecílio - o da foto acima. A partir de agora conto como os dois entraram na história do casal passeador, uma história verídica, devidamente registrada e documentada, do tempo em que se escrevia "São JerônYmo", "CanÔas", "EmpreZa" e "Xarqueadas".
Cecílio, natural de Porto Alegre, nascido em fevereiro de 1902 e falecido em julho de 1976, trabalhava como pesador do carvão que chegava de trem, vindo de Arroio dos Ratos, para o Consórcio Administrador de "Emprezas" de Mineração - CADEM, na cidade de Charqueadas. Naquele noite de 23 viu um objeto grande e brilhante no chão, emitindo fortes luzes coloridas, e juntou. Numa olhadela, já reconheceu o possível valor daquela joia. Depois de levá-la para casa e mostrar para Otília, foi até a "empreza" e a entregou, relatando onde a encontrara, a fim de que fossem identificados os proprietários. Fez o que entendia ser o seu dever, o que era certo, fruto da sólida formação ética e moral familiar. O que é dos outros, é dos outros. E, ato feito, continuou levando a vida, normalmente.
Dias depois, em 6 de setembro, recebeu um "memorandun" da "empreza", da sede em "São Jerônymo" para a filial em "Xarqueadas", com cópia anexa de uma carta datilografada do senhor Prodebon. Esses documentos existem, amarelados e manchados, sob guarda da família. Vou transcrever a carta, com a grafia exata utilizada na mesma:
"
Canôas, 27 de agosto de 1941
Senhores.
Com a presente, tenho a subica honra de vir a presença de VV. SS., afim de agradecer penhoradamente aos DD. Diretores déssa Companhia, pelo procedimento honroso e leal do Vosso auxiliar, Snr. Cecilio Rocha - pesador -.
No dia 23 do corrente, quando de passagem do Porto de Xarqueadas á Fazenda do meu sogro Snr. LuizGarcia; viajando acompanhado de minha senhora, ao chegarmos á Fazenda, ela constatou a falta de um broche de platina cravejado com pedras de brilhantes. No dia imediato quando telefonei aos escritórios déssa Companhia, soube ter sido a referia joia encontrada pelo Sr. Rocha, de que no mesmo dia me fez a entrega.
Termino felicitando os Snrs. Diretores, pela bôa escolha de vossos auxiliares.
Sem mais, subscrevo-me com os protestos da minha elevada estima e distinta consideração.
( ass) - A. João Predebon"
Pois então, eis o ato honrado de um trabalhador, que permanece no tempo, como exemplo. Essa história, inclusive, é narrada no livro Histórias do Povo de Charqueadas (2012), do jornalista e escritor Saldino Antônio Pires, quando o autor aborda a biografia de Cecílio, que é nome de rua na cidade.
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