Encontro do Dia dos Pais em família, meio-dia de ontem. Churrasco, fotos. Todos gremistas. Sinto, claro, a saudade de sempre do meu pai, o da foto acima, que há quatro anos está no céu azul, nos gramados celestiais.
- Quem vai no jogo, hoje?
- Eu vou.
- Eu vou.
- Eu vou.
- Quem sabe vamos todos?
- Vamos.
- Vamos.
- Vamos.
- Oba, vamos!
- Eba, vamos!
- Tenho uma ideia: vamos todos pras cadeiras gold?
- Cadeiras gold? Não são caras?
- Tão em promoção, 90 pilas.
- Ah, bom.
- E as crianças pagam 20, os estudantes e o vovô pagam metade. Só vocês dois pagarão 90.
- Ah, então vamos nessa. Ainda tem vaga no busão do Consulado?
- Tem. Vou ligar pro Zé e marcar os lugares.
E lá se foram eles. Eram seis: quatro homens e duas crianças - um guri e uma guria. Dos 80 aos 5 anos. Na ida, prognósticos sobre o placar:
- 4x0.
- 3x0.
- 2x0.
- 11x0.
- 2x0.
- 2x1.
- Olha aí, a pessimista. Tão pequena e já agindo como se fosse mulher.
- Parece colorada.
- Não esqueçamos que já foi botafoguense.
- E tá vestindo cor-de-rosa, que é quase vermelho.
- Tô com a minha camisa do Grêmio - defende-se.
O busão entrou na 290, trânsito lento. As crianças dormem. Ih, chegaremos tarde, mas tanto faz, é Dia dos Pais: a hora que chegar, chegamos; a hora que entrar, entramos. Ainda mais que dois terão de fazer o credenciamento lá na Arena pra comprar ingresso, pois não foi possível em Charqueadas. O mais esperto e líder da turma conseguiu fazer para todos, menos para os dois, não houve jeito.
Chegamos.
- Gente, o que será que o Inter deu de presente pro Grêmio hoje?
- Ué, por quê?
- Ora, hoje não é Dia dos Pais?
- Ah ah ah ah.
- Eh eh eh eh.
- Ih ih ih ih.
- Oh oh oh oh.
- Uh uh uh uh.
Subimos para o Atendimento aos Sócios. Estavam moças da Arena com cartazes "Precisa de Ajuda?" no pátio. Fomos na Jéssica. E ali ficamos um bom tempo. Já eram oito horas e o jogo começava oito e meia. A guria começou a chutar a perna do pai:
- Porque tu tá chutando o meu calcanhar.
- Quero entrar, tá frio.
- Tem que esperar, ainda não conseguimos o ingresso do teu vô.
- Tão pequena e já agindo como se fosse mulher. Precoce.
- Pai, quero colo - pediu o menor.
- Dá um tempo, tô ocupado aqui no celular.
- Que hora já é?
Dá um tempo, não incomoda.
Até que enfim, tudo pronto.
- Valeu, Jéssica.
Oito e vinte já estão todos sentados no corner das cadeiras gold, no lado do campo oposto ao da Geral do Grêmio. Ô vista boa, que dia. Hoje o Grêmio vai golear, diminuir o saldo e chegar aos 23 pontos. Eram 35 mil pessoas no estádio, ao contrário da minha expectativa para, no máximo, vinte mil. Pipoca, cachorro-quente, água mineral, Pepsi Black. Entram os times. Fogos, fumaça tricolor, que festa. O Sport Recife de amarelo.
- Olha aí, estão de amarelo, querem assustar o Grêmio pagando uma de Bayer Leverkusen.
Inicia a partida. Jogo chato. Grêmio superior, mas sem chegada. Só um lance de perigo defendido pelo goleiro do Sport. Nada do Grêmio golear. Termina o primeiro tempo. Frustração misturada com alegria. Tava bom o passeio, ótima a vista do jogo e da Arena ali das cadeiras gold. Começa o segundo tempo. Dali há pouco, gol do Sport.
- Não acredito que vai ser a primeira vitória dos caras no campeonato hoje, contra a gente, aqui na Arena.
- Não, vai ser 2x1, vou acertar o placar - diz a guria.
Trinta e poucos do segundo tempo e nada do Grêmio amassar e marcar. Vi que o Grêmio ia perder pros caras. Resolvo dar uma volta em torno do estádio, no anel das cadeiras gold dá pra fazer isso e, sempre que ali venho, gosto de dar esse passeio. Os outros ficam olhando o jogo. Passo por uma sala vazia e vejo três "chaves da Arena", de papelão, das que foram dadas na primeira partida depois do cara do pão ter comprado a Arena. "Bah, reclamaram que eu não trouxe chaves pra eles, agora estão essas aqui, de bobs, dando sopa. Vou levar." Seria o troféu da noite, como se só tivesse vindo na Arena pra pegar essas chaves: destino.
Já são 45 minutos quando volto pro meu lugar, a tempo de ver que o juiz dará cinco de desconto. Entrego as chaves.
- Eu quero - diz o vô. Mas de que adianta ter a chave da Arena se ela tá vazia de futebol?
Termina o jogo. Tremenda vai ecoa pela Arena. Derrota histórica do Grêmio, vitória histórica do Sport. O Grêmio foi "épico". Talvez não mude nada do previsto para o ano, com o Sport caindo de qualquer forma, ao fim, e o Grêmio novamente beliscando uma Sul Americana. Todavia, vivemos no presente, e hoje foi uma derrota vergonhosa do Grêmio para o pior baga da história do Brasileirão. Quem diria que, dez anos antes, num Dia dos Pais, o Grêmio fez 5x0 no Inter, de forma igualmente épica, embora inversa. Hoje, tinha de ser: destino.
Vamos para o ponto de encontro do busão do Consulado e o clima, paradoxalmente, estava bom. Afinal, foi um bom passeio e um ótimo domingo de Dia dos País. As crianças e o vovô dormiram na vinda. Pai Nosso que estais no Céu, preserve ainda por muitos anos domingos assim, em família. E um abraço de saudade para o meu pai que está no céu.