"A casa foi construída de frente pra nascente do sol, ao lado de uma grande paineira com galhos que quase encostavam no chão. No começo do inverno suas folhas caíam e davam lugar à lindas flores rosas que enfeitavam a sede da estância. Seus frutos eram grandes, quando ficavam maduros explodiam lançando ao chão as sementes e as painas" - Alma Açoriana, Eron Ferreira, página 31.
Lendo esse livro para a atividade do Clube do Livro de Charqueadas em Santo Amaro no dia 26 de abril, passei por esse parágrafo e viajei décadas no tempo, para o meu passado, lá na Colônia. Parecia a descrição da "minha paineira", em frente a casa cor-de-rosa voltada pro nascente. Fui lá ontem, revê-la. Já não apresenta o mesmo viço de décadas atrás, mas ainda floresce no tempo certo. As casas da rua estão todas diferentes, não existe mais nenhuma das originais de madeira, onde moravam seu Mancilha e dona Francisca, o Renatão e a Liliane, o Joel e a Tereza, o Pompeu e a Berenice, o Mauro e a Marlene, a dona Alzira, o sargento Alcides, o tenente Nelson, a Gringa e a Preta, o Daniel e a Binda, dentre outros que agora não recordo o nome de imediato. Nem nós e nem eles estão mais na Rua da Paineira. Não ficou ninguém.
Sim, a Rua da Paineira, como a chamávamos. Hoje é Rua das Camélias. Ou será que sempre foi e eu é que nunca me liguei por ser muito piá? A gurizada vinha com fundas bombardear os pardais na paineira, depois os depenavam e assavam. Gurí é fogo. Como era pequeno ainda - nos mudamos pra Cohab quando estava com 10 anos -, nunca fui bom o suficiente pra acertar um passarinho lá em cima. Meu passatempo preferido era correr em volta da paineira e o Renatão, que era Renner e primo da minha mãe pelo lado paterno (sua mãe, Sulferina Souza, era irmã do meu vô, Adolfo de Souza), dizia que eu parecia um "louquinho". Pegou o apelido: Louquinho da Paineira. Já escrevi sobre tudo isso aqui, to me repetindo. Pudera, as memórias não mudam, apenas retornam de vez em quando, como são, sempre as mesmas. Sejam bem vindas novamente, caras amigas.
Fui lá e fiz umas fotos, que ficaram que nem a minha cara é agora, mas não é por culpa minha: o celular é velho e não havia sol ontem de manhã. O que importa é que a grande paineira da minha infância ainda está lá, impávida sobre a calçada de grama e lançando sua sombra sobre a rua de chão batido pelas tardes e, assim, eu ainda posso ir lá e voltar a incorporar o Dondinho de Souza Guerreiro.
Um bom final de semana para todos. Cuidem-se, vacinem-se, apreciem as paineiras em flor, vivam e fiquem com Deus.