O seis está na ordem do dia: escala 6x1 e dólar a 6 reais. Temos também a aposentadoria aos 65 anos e o crescimento do trabalho informal para os maiores de 60 anos. É a treva! Número da besta, pior que o 666! Esse 6.666, portanto, é economicamente diabólico, especificamente para os que vivem de salário, principalmente do mínimo.
Por falar nele, sabe quem era contra a instituição do salário mínimo? Pasmem: Karl Marx. Ele mesmo, quem diria, o maior dos teóricos socialistas a defender os trabalhadores, o famoso e cultuado filósofo e economista político alemão. Deu-se na França isso, e por proposta dos... socialistas! Marx disse no final da década de 1870 ao líder parlamentar socialista Júlio Guesde, que defendia tal medida, que se devia lutar sempre pelo máximo salarial, nunca por um mínimo, eis que os patrões passariam a fincar pé nesse mínimo, em favor de seus interesses. Guesde fez ouvidos de mercador aos conselhos de Marx. Agora, nós aqui no Brasil, 150 anos depois, vemos a maior parte de aposentados e pensionistas reduzidos ao salário mínimo (por aqui, foi Getúlio Vargas, em 1940, que o instituiu), cuja correção, ainda por cima, é atacada pelo "mercado" com culpada pelos números da Previdência, essa bendita invenção política e econômica que, no Brasil, distribui renda e é responsável em injetar muita grana nos municípios, via massa salarial de benefícios pagos. Sem isso, já estaríamos no caos social. E vejam que nem falei ainda da situação do SUS, outra salvaguarda para a sobrevivência do andar de baixo da população.
Ora, o "mercado" e a sua "mão invisível" - metáfora famosa do economista e filósofo escocês Adam Smith em seu livro A Riqueza das Nações (1776) - , deseja ainda outra reforma da Previdência, ampliando a realizada pelo governo Bolsonaro, que subiu para 65 anos a idade mínima. E justamente nessa semana os jornais noticiam que cresce o trabalho informal entre os maiores de 60 anos de idade! A informalidade, fruto da reforma trabalhista e dos ajustes fiscais, campeia e, com ela, vem a desgraça para as contas da Previdência, pela retração da base de arrecadação, além da sonegação patronal que grassa em níveis alarmantes. Tudo isso estoura ainda no SUS, que teve também sua base de investimentos atacada por uma PEC no governo Temer. Só que o "mercado" não é uma ficção literária ou fantasmagoria, é bem visível e formado por pessoas de carne e osso que possuem interesses bem específicos naquilo que Marx chamou de luta de classes, ou seja, os interesses econômicos divergentes entre capital e trabalho.
Por isso que a economia não é uma ciência exata, muito longe disso: é uma ciência política, tanto que nos tempos de Smith e Marx era chamada de Economia Política, pois das decisões políticas derivam as políticas econômicas: uns tem de perder para outros ganharem. Vejamos no Brasil. Delfim Netto foi o ministro da Economia no Regime Militar a dizer que primeiro deveríamos fazer o bolo crescer, para depois o dividir. O bolo cresceu, o Brasil é há tempos a décima economia do planeta, mas ainda possui a pior distribuição de renda deste, ou seja, o bolo não foi dividido. O grande problema do nosso país é esse: uma grande economia com um povo pobre, eis que somente algo em torno de 10% da população recebe mais de cinco salários mínimos, nesse índice incluídos os grandes salários públicos e privados e os ricos.
Com a desregulamentação causada pela reforma trabalhista no governo Temer, as contas da Previdência foram pro beleléu, indo na contramão do que se deveria fazer para preservá-las face ao envelhecimento da população. E essa foi uma decisão política e ideológica, nada a ver com uma dita "ciência econômica" que, como exata, não existe, por ser, repito, humana. E quem pagará essa conta deficitária? Os do andar de baixo, claro. Já a estão pagando. Se hoje as pessoas já não encontram emprego pós os 60 anos, a não ser ser precariamente na informalidade, quem dirá com o avanço implacável da revolução digital agudizando o desemprego estrutural tecnológico. Tem economistas europeus inclusive propondo uma renda mínima universal para essa massa que será excluída do mercado de trabalho e, se já está assim na Europa, imagina por aqui. Estamos falando de nossos filhos e netos, eles serão essa massa excluída, sem aposentadoria e com um SUS falido.
Essa política liberal de constantes ajustes fiscais sobre o povão assalariado, num país com brutal concentração de renda, será mais catastrófica do que o modelo neoliberal que vimos dramaticamente ruir no Chile, anos atrás. Quando o governo Lula propôs recentemente um ajuste que, em 2026, prevê isenção de imposto de renda até 5 mil reais, o "mercado" reage, com sua "mão invisível", elevando especulativamente o dólar para mais de 6 reais. Nesse mesmo contexto, são justamente as forças políticas do "mercado" que reagem ao fim da escala de trabalho 6x1, demonizando-a como tragédia e quimera, quando o inverso, isto é, os ajustes fiscais liberais, é que o são. Ora, sabemos que há países no G20 onde se trabalha numa carga 32 horas semanais e são mais poderosos e ricos do que o Brasil. Mais: fora a tal renda mínima europeia, seria justamente uma redução de jornada que frearia, em parte, os efeitos do desemprego estrutural tecnológico, gerando mais empregos formais e, quem sabe, até, diminuindo a concentração de renda, pois o dinheiro que uns tem demais tem de ir pra quem tem de menos.
Não há saída fora da formalidade, do desenvolvimento tecnológico digital, do crescimento econômico agro-industrial com empregabilidade e de uma Previdência e um SUS fortes. É uma questão de decisões que a sociedade tomará em termos de Economia Política, levando em conta o bem comum. Ajustes fiscais já se mostraram tanto inócuos na resolução dos problemas da crise quanto perversos para com 90% da população. Há outros caminhos para se tomar fora dos ajustes fiscais e dessa diabólica fórmula 6.666, que transforma a vida num inferno para a maioria: escala 6x1, US$ 6,00, idade limite de 65 anos com grande desemprego acima dos 60 anos.