João Adolfo Guerreiro
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O funeral ecumênico de Doracy

 

Doracy de Souza Fernandes passou 88 anos neste plano físico. Nasceu em 1936 e faleceu esta semana. Fui no seu velório e, lá, testemunhei uma rara cerimônia ecumênica na despedida de seu corpo físico por amigos e familiares.

 

Primeiro, ocorreram os ritos fúnebres católicos, realizado por um ministro e incluindo o Credo, o Pai Nosso e a Ave Varia. Após, os cânticos de Umbanda, entoados pelos presentes. Naquele momento triste, de perda e lamento, observar a convivência harmônica e respeitosa entre seguidores de duas religiões cristãs com origem, história e doutrina diferentes, foi alentador, benfazejo e edificante. A milenar Igreja Católica, maior religião do Ocidente, oriunda do Concílio de Niceia; a centenária e sincrética Umbanda, única religião com origem brasileira, amálgama de cultos africanos, kardecismo e catolicismo.

 

Doracy praticou por 60 anos a Umbanda, na qual era considerada e influente em Charqueadas. Residia na Vila Santo Antônio e era viúva de João Baptista Fernandes, casamento que gerou cinco filhas, quatro filhos, 18 netos e 19 bisnetos. Sua filha Cibele se manifestou sobre a passagem da mãe, sendo que suas palavras ilustram mui bem o observado no velório:

 

"Um grande ato ecumênico foi realizado hoje pela passagem da minha mãe, algo ainda não registrado em nossa cidade, onde Igreja Católica e umbandistas, unidos, celebraram a encomenda do corpo de minha mãe. Mulher que abriu caminho para muitas outras religiosas na nossa cidade e região, em uma época em que nós, do gênero feminino, não tínhamos voz nem vez, em que a maioria dos sacerdotes eram homens. Minha mãe, junto com outras precursoras, abriram as portas para que hoje nós pudéssemos seguir nossas crenças, nossa devoção à Umbanda.

 

Em um ato de sincretismo religioso, firmamos hoje que é possível pessoas de todas as raças, crenças, gênero e ideologias diferentes darmos as mãos quando o amor está presente e tentar fazer um mundo melhor. Nossa ancestralidade está nos conduzindo até aqui e podemos ir mais adiante. Nós mulheres não somos mais queimadas nas fogueiras por sermos consideradas bruxas, nossas filhas e netas um dia também nos agradecerão, em nome daquelas que um dia foram estigmatizadas, perseguidas, oprimidas e mortas por serem 'diferentes'.

 

Quando amor, fé e respeito andam juntos de forma sincronizada e harmoniosa como hoje ocorreu, podemos dizer que ainda temos esperança de um mundo melhor para se viver."

 

Não poderia escrever com palavras mais adequadas o que presenciei na Capela Mortuária de Charqueadas. O sol brilha e o dia amanhece belo nesta sexta-feira. Que assim seja.

 

Um bom final de semana, Dia da Criança e da Padroeira do Brasil Nossa Senhora Aparecida para todos. Cuidem-se, vacinem-se, orem, vivam e fiquem com Deus.

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 11/10/2024
Alterado em 11/10/2024
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