João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Textos

Os irmãos Petit Charlie e Kilometric

 

Eram dois irmãos branquelos de olhos azuis e cabelos amarelos que moravam na mesma rua numa cidade média da região metropolitana, mas as semelhanças paravam por aí.

 

"Um é a cara da mãe e o outro o focinho do pai", como na canção do Gaúcho da Fronteira. Petit Charlie era baixinho e barrigudo, enquanto Kilometric era alto e magro, o primeiro colorado e o segundo gremista, um preferia as loiras e o outro as morenas, um solteiro e o outro casado, um microempresário e o outro funcionário público concursado, um Lula e o outro Bolsonaro. Filhos do mesmo pai e da mesma mãe, díspares, mas inseparáveis, os irmãos Petit Charlie e Kilometric.

 

Certa feita estava se armando um temporal e Kilometric pintava sua casa de cor-de-rosa. O vento forte soprando e ele lá, impávido e arrogante, como sempre fora, desde criança. Passou Petit Charlie vindo da empresa com três latões gelados de Original numa sacola de plástico verde e, precavido com sempre fora, desde criança, alertou o irmão:

 

- Kilo, sai daí, Vamos tomar umas geladas lá em casa e olhar o jogo do Inter.

- Não, daqui há pouco chega a Fátima e eu quero estar com a casa pronta.

- Mas tchê, já vai chover, tá vindo um temporal. Tu não viu?

- Ah, que temporal que nada, vai passar de lado e vai embora.

- Olha olha olha...

- Tá, valeu o convite, mas não enche o saco. Deixa eu trabalhar.

- Tá, tu que sabe, teimoso. Vai à merda, então, bolsominion.

- Vai à merda tu, esquerdopata idiota.

- Gremista otário.

- Colorado trouxa.

- Magrelo.

-Barrigudo.

Como se amavam os dois irmãos loiros de olhos azuis, tão díspares e tão inseparáveis.

 

E se foi Petit Charlie pra sua casa verde-limão com os latões de breja. Tomou um banho rápido, deitou-se na sala, colocou a netgato num canal de futebol e abriu uma. Espiava pela janela o vento movendo vigorosamente os galhos das árvores e pensava: "O Kilometric é muito doido, mas bah, vai se ferrar, eh eh eh eh ". Enquanto isso, seu irmão, na escada, dando os toques finais no oitão: "Vai dar tempo, eh eh eh eh, vai dar".

 

Passou-se meia hora e Kilometric desceu orgulhoso, ao mesmo tempo em que Petit Charlie via em HD, em sua TV de 100 polegadas de último modelo, o Inter levar o terceiro gol no Beira Rio, no mesmo instante em que um aguaceiro desabava em Porto Alegre. Desligou a TV, aborrecido, abriu outro latão e foi espiar na janela. O vento arrefecera. "Não é que o Kilometric tinha razão? Vai me encher o saco amanhã, o besta". Kilometric olhou no Whats que Fátima demoraria um pouco mais na cabelereira e resolveu ir na casa de Petit aceitar a gelada e olhar o segundo tempo da partida.

 

- Ué, o que tu tá fazendo aí, besta?

- Vim tomar a gelada e olhar o jogo, abobado.

- Tomou banho pelo menos, né?

- Tomei. E escapei do temporal...

- Imbecil. Tá, entra, então.

- Quanto tá o jogo?

- 3x0.

- Pro Inter?

- Pega a ceva na geladeira e não me amola, mala.

- Ih, pelo humor, já vi, eh eh eh eh.

 

Como se amavam os dois irmãos loiros de olhos azuis, tão díspares e tão inseparáveis. Não choveu e o jogo terminou 4x2.

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 14/12/2023
Alterado em 14/12/2023
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