Ontem à noite, na Biblioteca Pública Municipal Vera Gauss, em Charqueadas, foi realizada a primeira sessão do Clube do Livro local, onde foi debatido o romance O médico e o monstro (1886), de Robert Stevenson - que aparece em várias edições e formatos na foto acima, de Carina Paim. Um momento agradável onde impressões sobre a leitura da obra clássica do gênero terror do século XIX foram compartilhadas. Neste artigo, aterei-me às minhas observações sobre o texto.
Em O médico e o monstro estamos vendo como a consciência coletiva (aqui entendida como a define o conceito do sociólogo Emile Durkheim) pressiona a consciência individual da pessoa e a leva a ter uma dupla personalidade: uma - máscara - para a sociedade, em cumprimento às regras morais da mesma e, logo, conforme à consciência coletiva; e outra para sua vida privada e secreta, longe dos olhos das pessoas, e própria de sua consciência individual.
Entretanto, o monstro, na verdade, tem traços de personalidade que indicam se tratar de um psicopata, levando em conta a composição da personagem. Como o médico teria uma moral dupla e sincera, como mostra o livro, se seu lado sombrio é o de um psicopata, que são definidos justamente por não terem empatia, sentimento de culpa e, portanto, limites éticos e morais? Não são loucos, pois estão conectados à realidade, mas tampouco são normais, pela incapacidade de empatia e ausência moralidade. Esse, creio, é um problema para o romance, pois os psicopatas, independente da máscara que assumam, nascem e morrem como psicopatas, é próprio de sua doença. Logo, a caracterização do médico - com consciência moral, empatia e remorso - como o lado bom do mesmo individuo, torna-se inverossímel nos dias atuais, baseando-se no conhecimento científico oriundo da Psicologia Forense.
A obra, por outro lado, acerta em mostrar a pressão da consciência coletiva sobre a consciência individual (1), tensionando a pessoa e ocultando o seu lado sombrio. Creio que esse era o objetivo de Robert Stevenson ao escrever o livro, que é um dos clássicos de terror junto a Frankenstein (1818) de Mary Schelley e a Drácula (1897) de Bram Stoker, ambos produzidos no século XIX no Reino Unido, de inspiração gótica e destacando o papel do pensamento científico no desvendar da realidade objetiva. Pessoalmente, vejo-o mais como um livro moral do que de terror.
O Clube do Livro se reunirá sempre na terceira semana de cada mês, às terças-feiras, às 19 horas, na Biblioteca Pública Municipal, no Parcão. Visando inicialmente continuar na leitura e debate dos clássicos do terror do século XIX, dia 16 de maio será Drácula e 13 de junho Frankenstein. As reuniões do clube são livres aos interessados, que poderão antecipadamente retirar por empréstimo os livros na biblioteca para leitura.
(1) - Esses conceitos sociológicos ainda não existiam em 1886, Durkheim os formularia lodo adiante, nos anos 1890. Stevenson apenas trabalha com o lado bom (público) e o lado mau da personagem (oculto), mas aplico os conceitos na análise da obra.