João Adolfo Guerreiro
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Textos

Pedreiros e tijolos

 

Iniciei minha vida profissional trabalhando como servente de pedreiro para um tio materno e seu sócio. Comprei minha primeira guitarra, caixa de som e pedal de distorção na Casa da Música de Porto Alegre com a grana advinda desse trambe. Uau syl, tempo bom esse: a minha felicidade era um crediário na Casa da Música! Até no cemitério pegamos uma empreitada!

 

Hoje, como consumidor do serviço desses profissionais, sei que existem dois tipos básicos de pedreiros: o que te dá quase certo o orçamento do material e aquele que, lá pela metade da obra, começa a dizer que tá faltando tijolo, mais isso e aquilo. O segundo é uma baita dor de cabeça e prejuízo, chegando a dobrar os custos por fora do orçamento previsto. Sim, não é só no setor público, com as empreiteiras, que isso acontece. Aliás, até para ser mais exato e atual, pedreiro já virou outra coisa!

 

Em outros tempos, pedreiro era pedreiro e maconheiro era maconheiro, as duas atividades não se confundiam. Hoje não, tu tens de chamar o pedreiro de construtor para não confundir com os maconheiros, ou mais precisamente falando, com aqueles que vivem da ou na "pedra", a droga dos dias atuais. Maconha é coisa de tiozão, até. E o pior é que o "pedreiro" atual é mais apropriado para o termo, visto que o pedreiro construtor não trabalha com pedras, e sim com tijolos, enquanto o pedreiro atual, concretamente, lida com "pedras" mesmo, como já disse.

 

E parece até que os tijolos também já estão ficando no passado, nas grandes construções. Recentemente construíram uma emorme farmácia em tempo recorde aqui perto de casa, da mesma forma que uma penitenciária na cidade. Tudo já vem pré-pronto e os operários só vão montando a coisa, acelerando sobremaneira o andamento do serviço. Mas quanta gente deixou de trabalhar com o abandono dos tijolos nas obras de porte? Onde antes haviam cem, quantos são necessários hoje? É a crise da empregabilidade visível à luz do dia nesse tórrido verão de sol escaldante e ofuscante, atingindo não apenas os cobradores do Vitória, mas também os pedreiros, ou melhor, os profissionais da construção civil. Tijolos estão mais nos livros de poesia, como no do meu amigo Jucimar Estrela. Ah, e por falar em poesia, o poema Operário em Construção, de Vinícius de Moraes, e a canção Construção, de Chico Buarque, estão ultrapassadas, eis que seus versos, anacronicamente, falam em tijolos, nas grandes construções.

 

Tijolos, agora, mais os de maconha e os de coca - e não me refiro ao famoso refrigerante -, "material" de "trabalho" dos "pedreiros". Os tempos mudam, as coisas mudam e o sentido das palavras também, vê-se. Saudades do tempo bom de ajudante do tio Ivan e do Breno, época de bons pedreiros e de bons tijolos, inteiros ou meios, maciços ou de seis furos.

 

"Trabalhei durante décadas

Incansavelmente sem parar

Juntei tijolos, construí meus versos

objetivos me fizeram andar.

(...)

Preparei o terreno sólido, e de cada

Verso ergui paredes de adjetivos..."

 

Tijolos - Jucimar Estrela.

 

 

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 01/02/2023
Alterado em 01/02/2023
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