João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Textos

Oliveira Silveira e o 20 de Novembro

 

Durante o VIIIº Sarau Literário de Charqueadas, por iniciativa da bibliotecária Carina Paim, tivemos, na Biblioteca Municipal Vera Gauss, uma exposição de banners mostrando a biografia e a trajetória literária e ativista do professor e poeta gaúcho Oliveira Silveira (1941 - 2009). Ele é conhecido, principalmente, por, junto ao Grupo Palmares, sediado em Porto Alegre, ter proposto, em 1971, o 20 de Novembro como data de celebração da Consciência Negra, em substituição ao 13 de maio, dia da Abolição da Escravatura no Brasil.

 

O motivo? Ele mesmo nos explica, no poema Treze de Maio (Obra reunida, IEL, 2022, p. 249).:

 

Treze de maio traição,

liberdade sem asas

e fome sem pão.

 

Liberdade de asas quebradas

como

este verso.

 

Liberdade asa sem corpo:

sufoca no ar,

se afoga no mar.

 

Treze de maio – já dia 14

o Y da encruzilhada:

seguir

banzar

voltar?

 

Treze de maio – já dia 14

a resposta gritante:

pedir

servir

calar.

 

Os brancos não fizeram mais

que meia obrigação.

 

O que fomos de adubo

o que fomos de sola

o que fomos de burros cargueiros

o que fomos de resto

o que fomos de pasto

senzala porão e chiqueiro

nem com pergaminho

nem pena de ninho

nem cofre de couro

nem com lei de ouro.

 

O que fomos de seiva

de base

de Atlas

o que fomos de vida

e luz

chama negra em treva branca

 

quem sabe só com isto:

 

que o que temos nós lutamos

para sobreviver

e também somos esta pátria,

em nós ela está plantada,

nela crispamos raízes

de enxerto mas sentimos

e mutuamente arraigamos.

 

Quem sabe só com isto:

que ela é nossa também, sem favor,

e sem pedir respiramos seu ar

a largos narizes livres

bebemos à vontade de suas fontes

a grossas beiçadas fartas

tapamos-destapamos horizontes

com a persiana graúda das pálpebras

escutamos seu baita coração

com nosso ouvido musical

e com nossa mão gigante

batucamos no seu mapa.

 

Quem sabe só com isto:

 

que esta bandeira deveria ser

acobreado-indígena e também

brancolusa e também

pretinegra, na essência afro-diáspora,

etnicor ou de todas as cores

como a alma do Brasil.

 

Quem sabe nem com isto

 

e então vamos rasgar

a máscara do treze

para arrancar a dívida real

com nossas próprias mãos.

 

A história registra que o 20 de Novembro, data da morte de Zumbi dos Palmares (1655 - 1695), foi divulgado nacionalmente em um manifesto do Movimento Negro Unificado (1978), incluído como efeméride escolar em 2003 e como data comemorativa nacional em 2011. Desde 2017 tramita projeto no Congresso Nacional visando transformar a data em feriado nacional. Em cinco estados (Alagoas - 1995, Rio de Janeiro - 2002, Mato Grosso - 2002, Amapá - 2007 e Amazonas - 2010) e em 1.044 cidades o 20 de Novembro é feriado, incluindo São Paulo - o que, curiosamente, não acontece em nenhuma cidade do Rio Grande do Sul, em cuja capital, vimos, a ideia nasceu.

 

É de Oliveira Silveira também uma proposta de alteração de parte do Hino Riograndense, devido a conotação racista do mesmo ("Povo que não tem virtude Acaba por ser escravo). Em 1993, o poeta sugeriu a seguinte redação: "Povo que é lança e virtude A clava quer ver escravo".

 

Seu legado literário está sendo, cada vez mais, estudado nas universidades e repercutindo para fora do movimento negro. Assim, pela passagem do Dia da Consciência Negra, no domingo, bradamos: Salve, poeta Oliveira Silveira!

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 22/11/2022
Alterado em 22/11/2022
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