Grande demais para ser homenageado numa crônica, mas é o que eu vou (tentar) fazer.
O cientista social, político trabalhista e escritor Darcy Ribeiro, uma das maiores personalidades brasileiras do século passado, faria 100 anos hoje. Um legado imenso, gigantesco para aqueles que amam (de verdade) o povo brasileiro e o Brasil.
Faleceu em 17 de fevereiro de 1997, aos 74 anos. Nasceu, obviamente, em 1922, no mesmo ano que outra importante personalidade brasileira e também trabalhista, Leonel Brizola. Lembremos que em 22 tivemos ainda a Semana de Arte Moderna. Logo, vê-se que Ribeiro veio predestinado a este mundo e país, sob o signo dos indignados e realizadores. Com formação em Antropologia, teve forte atuação junto aos índios brasileiros quando funcionário do Serviço de Proteção ao Índio, redigindo o projeto de criação do Parque do Xingu. Na época, trabalhou com o grande indigenista marechal Cândido Randon, uma influência para sua vida.
Ribeiro possui um significativo currículo político: Senador pelo RJ (autor da LDB), vice-governador carioca no primeiro governo Brizola (idealizador dos CIEPs) e ministro da Casa Civil e da Educação no governo João Goulart (aplicou as ideias do educador Anísio Teixeira). Na Educação, além dos CIEPs e da LDB, foi idealizador da Universidade Estadual do Norte Fluminense e um dos criadores da Universidade de Brasília, da qual foi o primeiro reitor. Foi titular da cadeira número 11 da Academia Brasileira de Letras. Autor de vários livros, poderia se destacar como leitura obrigatória de seu legado O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil, publicado em 1995, pouco antes de sua morte, em 1997, ano em que o Brasil também perdeu outro nome maiúsculo da Educação, Paulo Freire.
Darcy Ribeiro, como intelectual, sempre pensou o Brasil a partir de uma formulação teórica baseada na realidade brasileira visando transformá-la quanto à desigualdade e, coerente com isso, como político, militou no campo da esquerda. A propósito dessas duas facetas de Darcy, poderíamos pinçar uma declaração sua ao programa Abertura, em 1979: "A responsabilidade da ciência social, num país como o Brasil, é explicar por que o nosso atraso. (...) A causa somos nós, os educados, os ricos, que fizemos um país para nós, contra o povão. Então a ciência social é para estudar isso. (...) A maior parte dos cientistas sociais brasileiros não faz nada disso, são 'cavalos de santo' de Foucault, de Lévi-Strauss, que falam pela boca deles. Não olham para o Brasil, (...) são incapazes de olhar a realidade brasileira (...) e explicar, não só, as causas do atraso em que nós estamos, mas procurar perspectivas de como romper. (...) São incapazes de ajudar nisso. (...) Há um tipo de ciência social que é tão infecunda quanto a erudição antiga, essa erudição que sabia latim, que falava todas as línguas do mundo, de gente que não sabia nada, só citava, só se lembrava de um texto ou de outro. Essa gente indignificava a inteligência, pois convertia a inteligência, que é um instrumento de compreensão e transformação do mundo, num ato de fruição".
E era isso. É pouco a dizer sobre esse grande brasileiro, cuja importância é maior do que a comemoração do seu centenário. Fica o registro do fecundo político e intelectual que, ainda por muitas décadas, servirá de inspiração para aqueles que pensem um Brasil com mais igualdade e desenvolvimento. Valeu, Darcy Ribeiro!