João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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A gente não pode reclamar da vida, sabe?

 

A gente não pode reclamar da vida, sabe? Vamos na sexta-feira de manhã na OAB ver um parente pegar sua carteira e almoçamos em São Jerônimo, às margens do Rio Jacuí. Chegamos em casa, junto com as notícias da família. Um tio que mora no litoral sul, entre o mar e a lagoa, morreu de ataque cardíaco. Era o caçula da família paterna, 80 anos. Lá vamos nós, viagem sem gozo, se despedir do corpo de um cara legal e tri gente boa, que sempre nos recebeu com um sorriso no rosto, um abraço acolhedor, um café bem quente e um churrasco assado por sua neta mais velha.

 

Na volta, outra bomba: a mãe de um primo morreu de covid. Acreditam? Pois é, mas é verdade. A garganta ainda dói do resfriado recente e a voz continua desaparecida, perdida em algum lugar por aí. Domingo é Dia dos Pais, o primeiro em que o pai já não está mais entre a gente. Algo diferente, diferente tipo não legal, tristonho. Como estamos trabalhando, nos mantemos um pouco anestesiados. E ganhou o dia o texto da filha no Face dizendo coisas legais e o delicioso doce dietético que a esposa fez. Sim, a gente não pode reclamar da vida, pois estar vivo e empregado é dádiva. É só pensar nos mortos e desempregados, que adorariam estar em nosso lugar.

 

Na segunda-feira cai uma chuva de pedras, no início da noite. Saiu barato, pois nada se quebrou ou estragou no telhado. Na terça vamos no aniversário do cunhado, comemorar a vida e a saúde, dele e nossa. "It's now or never"- como cantou o Elvis. Ao chegar em casa, cadê a gata cinza peluda, que não se apresentou pro rango? Ih... No outro dia a tarefa principal é achar a sumida. Lá está ela, atirada no terreno baldio. Suspeito que a chuva de pedra não tenha saído tão barato assim. Vamos lá enterrar a bichana.

 

Por falar pela terceira vez em enterro, a irmã liga: "Quebraram o vidro do túmulo do pai e da mãe". Estão quebrando e roubando tudo lá no Júlio Rosa, nem os mortos os ladrões deixam ficar de boa. Não tinha nada pra roubar no túmulo, mas os caras foram lá e quebraram o vidro assim mesmo. Na verdade, estava demorando a chegar a nossa vez, ou melhor, a vez do pai e da mãe serem desrespeitados em seu descanso eterno.

 

A gente elabora planos contando com as pessoas, mas elas partem repentinamente. Então o melhor plano é o dia de hoje, com quem está por aí. Almoço na casa da irmã para comemorar o aniversário dela. A netinha linda e risonha faz o maior sucesso, indo de colo em colo. De noite a gata preta se deita no colo da gente e ronrona, enquanto lemos acomodados na poltrona da biblioteca, bebericando um café passado. A gente não pode reclamar da vida, sabe?

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 17/08/2022
Alterado em 17/08/2022
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