A octogenária Isabel
O Chile é terra de grandes escritores, como os poetas ganhadores do Nobel de Literatura de 1945 Gabriela Mistral (1889 - 1957) e de 1971 Pablo Neruda (1904 - 1973). Na prosa temos, desde os anos 1980, Isabel Allende, cujos romances atingiram um patamar de relevância em todo o mundo.
Ao contrário de Mistral e Neruda, Allende não nasceu no Chile, mas sim em Lima, capital peruana, pois seu pai era um diplomata chileno em serviço naquele país e primo-irmão de Salvador Allende, o presidente socialista eleito democraticamente em 1970 e deposto pelo infame general Augusto Pinochet em 1973, dando início a um período ditatorial e ultraliberal que duraria até 1990.
Esse fato e contexto marcariam a obra de Isabel, principalmente seu primeiro e mais famoso livro, A casa dos espíritos (1982), onde, através do realismo mágico, desenvolve a história de três gerações da família Trueba num país fictício, mas que guarda muitas - e propositais - semelhanças com o Chile, inclusive com sua ditadura militar. Onze anos após seu lançamento, A casa dos espíritos virou um filme homônimo, estrelado por atores famosos como Meryl Streep, Antonio Banderas, Jeremy Irons, Winona Ryder, Glenn Close e Vanessa Redgrave.
Outro livro de grande repercussão foi Paula (1995), uma autobiografia motivada pelo estado de coma pelo qual sua filha passava. O mais recente é Violeta, de 2021, em que, inspirada na biografia da mãe, criou uma personagem que nasceu durante a Gripe Espanhola e faleceu na de Covid-19, tendo vivenciado todo o contexto chileno e latino-americano de golpes e ditaduras militares e liberais.
Allende escreveu trinta livros que venderam cerca de 70 milhões de cópias em todo o mundo, traduzidos para mais de quarenta idiomas. Nascida em 2 de agosto de 1942, ao completar ontem seus 80 anos, embora não tenha sido agraciada com um Nobel como seus conterrâneos poetas, Isabel Allende possui uma obra significativa que fala sobre liberdade ao mundo de hoje, num momento em que este infelizmente parece recrudescer aos tempos de Guerra Fria e de anseios golpistas.