João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Gato no cesto de roupas

 

Aqueles olhos amarelos estão sempre me vigiando preguiçosamente de cima do armário mais alto. Nem liga se eu ligo a luz da cozinha, caso esteja dormindo. Algumas vezes fala comigo:

- O que tu estás fazendo aí, humano? Vai providenciar minha comida?

 

O nome do gato cinza e branco de olhos amarelos da minha esposa é Nestor. Faz suas necessidades na caixinha e não incomoda, a não ser por comida. Deita no meu colo no sofá e ronrona se acariciado. Se não, dorme, indiferente se passa jogo do Grêmio, Guerra na Ucrânia, Ana Maria Braga, missa do Divino Pai Eterno ou filme da Netflix no aparelho televisor. Só se liga se surge um gato miando, cachorro latindo ou leão rugindo, daí levanta as orelhas e fixa o olhar na telona. Fora isso, necas.

 

Observa com desdém os cachorros da casa pela janela, hostiliza os bichanos da rua e fita com interesse os passarinhos, silencioso. Gosta de comer verduras, principalmente brócolis, e batatas cozidas. Entra no banheiro e desarruma todos os tapetes, antes de dormir sobre um deles. Não deixa pegar no colo, mete a unha mesmo, sem concessões à sexo ou idade. Isso mesmo, deita no colo, mas não deixa pegar, ele é que manda e decide e pronto.

 

Na penumbra do banheiro, indo pro banho, tiro a bermuda e jogo no cesto. Ela se mexe. Ué? Fantasma? Magia? Não, o gato cinza Nestor. Surgem aqueles olhos amarelos, indignados.

- Não viu que eu tava dormindo aqui, humano?

- Puxa, desculpe, gato..

- Agora não adianta se desculpar, já me acordou.

 

Tirei a cueca e a camiseta. Os amarelos me fitando.

- O que foi?

- Tu não vai jogar isso em cima de mim também, né, humano?

- Não, claro, gato.

 

Entro no chuveiro. Um barulho me chamou a atenção. Nestor pulou e sentou em cima da divisória do box.

- O que tu tá fazendo aí, gato?

- Te olhando, humano,

- Sai daí.

- Por quê?

- Porque eu não gosto.

- Por que tu não gosta?

- Porque eu tô pelado.

- Eu tô sempre pelado e tu me olha.

- É diferente.

- Por quê?

- Tá, pode ficar aí, gato.

 

Passou um tempo quieto, olhando-me.

 

- O que é isso, humano?

- Isso o quê, gato?

- Essa coisa branca nos teus pelos da cabeça. 

- Ah, isso aqui é xampu.

- Pra que tu usa isso?

- Pra limpar o cabelo e deixar ele cheiroso.

- Ah, tá. Eu não preciso colocar isso. Basta a língua.

- Por isso tu fede.

- Tu fede mais do que eu.

- Bem capaz!

- Deita lá no cesto pra ti ver o cheiro da tua pele, então.

 

Nestor desce e volta para o cesto. Saio do chuveiro, enxugo-me. Olho ele lá, dormindo. Junto a roupa do chão e jogo, com a toalha molhada, por cima dele, fechando a tampa.

- Humano mal-educado!

- Gato espaçoso!

- Vou mijar no teu violão.

- E eu vou contar pra Solange que o "Nestorzinho" dorme no cesto, em cima da roupa dela.

- Ah, isso não vale, humano.

- Guerra é guerra, gato.

 

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Uma boa semana para todos. Cuidem-se e fiquem com Deus.

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 09/05/2022
Alterado em 09/05/2022
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