João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
Textos
Consciência
O melhor lugar para se trabalhar é na madrugada. Silêncio. Ausência de gente. O Inferno são os outros, como diz o título de um dos livros da coleção Adèle na vitrine da livraria do shopping – o de capa azul, se não me engano. A frase é de Sartre? É ou não é? Tu sabes ou não? Não importa, o que importa, de fato, é a frase.
Num 19 de novembro, mataram um cliente num shopping, em Porto Alegre. Numa treta com os seguranças, mataram o sujeito à porrada. E o cara era afrodescendente. No dia seguinte seria 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra. A data nasceu justamente na capital gaúcha, onde o pessoal se reunia na Esquina Democrática toda sexta-feira ao final do dia. Eu via quando estudava na cidade. Saía da aula, passava por lá e acompanhava. Achava legal aquilo, curtia. Era finalzinho dos anos 1980. Achava o mundo mais legal naquele tempo. Ou era apenas eu que era mais jovem, mais esperançoso e mais dado às utopias sobre mudança social e igualdade, achando que o paraíso futuro eram os outros. Na verdade, o mundo e a cidade sempre foram o que são, a cambiar apenas o ponto de vista com a idade, coisa assim. Sacam?
No final dos anos 1980 não havia esse lance de shopping pra tudo quanto é lado. Atualmente, até em Charqueadas e São Jerônimo tem shopping! Bom. As coisas mudam, mudam as cidades. Hoje se discute e se polemiza sobre as políticas afirmativas transitórias como as cotas raciais, originárias dos Estados Unidos dos anos 1960. Se tu vais num shopping hoje, já deve ter reparado a grande quantidade de pessoas afrodescendentes nos serviços de limpeza e segurança. Reparou? E reparou também que não se vê tanto cliente igual circulando? Poderia perguntar, numa aula de Sociologia no Ensino Médio, o motivo disso. Desnaturalizar e estranhar a realidade social onde vivemos e que conhecemos a fim de compreendê-la intimamente, eis os princípios epistemológicos da Sociologia em sala de aula de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais. Ver, questionar e pesquisar essas coisas num shopping faz parte disso. Tanto para conhecer quanto para tomar consciência. Construir conhecimento e tomar consciência.
Os cinemas, as livrarias, os restaurantes, os supermercados, as lojas e até os teatros e casas de shows estão nos shoppings. Nos anos 1980 estavam dispersos pela cidade. Então tu podes ir a um shopping e ver muita coisa por lá, concentrada, atomizada. É só sentar numa cadeira na praça de alimentação e investigar com um olhar sociológico de escola enquanto almoça. Não havia Sociologia nas escolas nos 1980, só História e OSPB, mas passavam longe de tais princípios epistemológicos. Não ensinavam a ver, questionar e pesquisar. Saber e consciência construindo pensamento crítico.
Zumbi dos Palmares teria morrido num 20 de novembro lá pelo apagar das luzes – de velas - dos anos 1600. Diz a História, de quando os negros eram escravos - contudo, resistiam e combatiam. O pessoal lá no centro de Porto Alegre pensou nessa data justamente por isso, há cinquenta anos. No tempo de Zumbi, assim como nos anos 1980, não existiam shoppings para se passear, comer, comprar, trabalhar e morrer. Todavia, isso tudo era feito e a consciência também surgia.
A consciência é um patrimônio inesgotável a brotar da realidade dos oprimidos e excluídos, por eles edificada e inundando de luz suas mentes a cada período histórico, mudando a sociedade. Mantenham a ação esperançosa que dela surge. Perseverem. É legal de se ver isso, pois o que importa, de fato, é a consciência, que liberta das madrugadas silenciosas da exclusão, do preconceito e da violência. Pelo menos ilumina caminhos para isso.
O inferno da inconsciência e o paraíso da consciência somos nós que fazemos, eis que a escuridão e a claridade, em sociedade, não são fenômenos naturais, mas sociais.
O melhor lugar para se trabalhar é na madrugada. Silêncio. Ausência de gente. O Inferno são os outros, como diz o título de um dos livros da coleção Adèle na vitrine da livraria do shopping – o de capa azul, se não me engano. A frase é de Sartre? É ou não é? Tu sabes ou não? Não importa, o que importa, de fato, é a frase.
Num 19 de novembro, mataram um cliente num shopping, em Porto Alegre. Numa treta com os seguranças, mataram o sujeito à porrada. E o cara era afrodescendente. No dia seguinte seria 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra. A data nasceu justamente na capital gaúcha, onde o pessoal se reunia na Esquina Democrática toda sexta-feira ao final do dia. Eu via quando estudava na cidade. Saía da aula, passava por lá e acompanhava. Achava legal aquilo, curtia. Era finalzinho dos anos 1980. Achava o mundo mais legal naquele tempo. Ou era apenas eu que era mais jovem, mais esperançoso e mais dado às utopias sobre mudança social e igualdade, achando que o paraíso futuro eram os outros. Na verdade, o mundo e a cidade sempre foram o que são, a cambiar apenas o ponto de vista com a idade, coisa assim. Sacam?
No final dos anos 1980 não havia esse lance de shopping pra tudo quanto é lado. Atualmente, até em Charqueadas e São Jerônimo tem shopping! Bom. As coisas mudam, mudam as cidades. Hoje se discute e se polemiza sobre as políticas afirmativas transitórias como as cotas raciais, originárias dos Estados Unidos dos anos 1960. Se tu vais num shopping hoje, já deve ter reparado a grande quantidade de pessoas afrodescendentes nos serviços de limpeza e segurança. Reparou? E reparou também que não se vê tanto cliente igual circulando? Poderia perguntar, numa aula de Sociologia no Ensino Médio, o motivo disso. Desnaturalizar e estranhar a realidade social onde vivemos e que conhecemos a fim de compreendê-la intimamente, eis os princípios epistemológicos da Sociologia em sala de aula de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais. Ver, questionar e pesquisar essas coisas num shopping faz parte disso. Tanto para conhecer quanto para tomar consciência. Construir conhecimento e tomar consciência.
Os cinemas, as livrarias, os restaurantes, os supermercados, as lojas e até os teatros e casas de shows estão nos shoppings. Nos anos 1980 estavam dispersos pela cidade. Então tu podes ir a um shopping e ver muita coisa por lá, concentrada, atomizada. É só sentar numa cadeira na praça de alimentação e investigar com um olhar sociológico de escola enquanto almoça. Não havia Sociologia nas escolas nos 1980, só História e OSPB, mas passavam longe de tais princípios epistemológicos. Não ensinavam a ver, questionar e pesquisar. Saber e consciência construindo pensamento crítico.
Zumbi dos Palmares teria morrido num 20 de novembro lá pelo apagar das luzes – de velas - dos anos 1600. Diz a História, de quando os negros eram escravos - contudo, resistiam e combatiam. O pessoal lá no centro de Porto Alegre pensou nessa data justamente por isso, há cinquenta anos. No tempo de Zumbi, assim como nos anos 1980, não existiam shoppings para se passear, comer, comprar, trabalhar e morrer. Todavia, isso tudo era feito e a consciência também surgia.
A consciência é um patrimônio inesgotável a brotar da realidade dos oprimidos e excluídos, por eles edificada e inundando de luz suas mentes a cada período histórico, mudando a sociedade. Mantenham a ação esperançosa que dela surge. Perseverem. É legal de se ver isso, pois o que importa, de fato, é a consciência, que liberta das madrugadas silenciosas da exclusão, do preconceito e da violência. Pelo menos ilumina caminhos para isso.
O inferno da inconsciência e o paraíso da consciência somos nós que fazemos, eis que a escuridão e a claridade, em sociedade, não são fenômenos naturais, mas sociais.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 20/11/2021
Alterado em 20/11/2021
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