João Adolfo Guerreiro
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Textos
Militares da Legalidade

Assim como em vários momentos de nossa história, na Campanha da Legalidade - que completa 60 anos em 2021 - os militares também não atuaram como um bloco monolítico de interesses. Vários personagens de farda foram importantes para o sucesso da Legalidade, mas me aterei a apenas dois nesse texto: o marechal Henrique Teixeira Lott e o general Machado Lopes (foto acima, com Jango e Brizola).

O primeiro militar de alta patente a se insurgir contra o golpe pretendido pelos ministros militares de Jânio Quadros (1917 - 1992), após a renúncia do mesmo, foi o marechal Henrique Teixeira Lott (1894 - 1984), divulgando um manifesto em defesa da posse do vice-presidente João "Jango" Goulart (1919 - 1976). Lott, que foi candidato a presidente na eleição que Jânio venceu, já havia combatido outra tentativa de golpe contra as regras constitucionais, em 1955, ao colocar as tropas sob seu comando na rua a fim de garantir a posse do presidente eleito, Juscelino Kubitscchek (1902 - 1976). Além de orientar o governador Leonel Brizola (1922 - 2004) a contatar comandantes militares com perfil ideológico legalista, defensores da regra constitucional, como os generais Oromar Osório e Pery Bevilacqua, que aderiram de pronto à Campanha da Legalidade, foi enfático em seu manifesto:

"Aos meus camaradas das Forças Armadas e ao povo brasileiro. tomei conhecimento, nesta data, da decisão do Senhor Ministro da Guerra, Marechal Odílio Denis, manifestada ao representante do governo do Rio Grande do Sul, deputado Rui Ramos, no Palácio do Planalto, em Brasília, de não permitir que o atual Presidente da República, Sr. João Goulart, entre no exercício de suas funções, e ainda, de detê-lo no momento em que pise o território nacional. Mediante ligação telefônica, tentei demover aquele eminente colega da prática de semelhante violência, sem obter resultado. Embora afastado das atividades militares, mantenho um compromisso de honra com a minha classe, com a minha pátria e as suas instituições democráticas e constitucionais. E, por isso, sinto-me no indeclinável dever de manifestar o meu repúdio à solução anormal e arbitrária que se pretende impor à Nação. Dentro dessa orientação, conclamo todas as forças vivas do país, as forças da produção e do pensamento, dos estudantes e intelectuais, dos operários e o povo em geral, para tomar posição decisiva e enérgica no respeito à Constituição e preservação integral do regime democrático brasileiro, certo ainda de que os meus camaradas das Forças Armadas saberão portar-se à altura das tradições legalistas que marcam sua história no destino da Pátria."

O ministro da Guerra golpista, general Odílio Denys, manda deter Lott por 30 dias, mas esse só cumpriria 15, eis que liberto dias após a posse de Jango, em 7 de setembro. O manifesto do marechal Lott foi um divisor de águas entre os militares brasileiros, opondo legalistas, defensores do cumprimento da Constituição de 1946 e da posse de Jango, e os golpistas, que evocavam a desculpa comunista para encobrir seus compromissos com a defesa dos interesses dos grandes empresários, contrários ao ex-ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, Goulart. Porém, o militar que, por sua posição constitucionalista, praticamente selou o destino das intenções golpistas e garantiu a posse do vice-presidente foi o general José Machado Lopes (1900 - 1990), comandante do IIIº Exército.

Militar experiente em combate, participou da IIª Guerra Mundial, onde lutou, dentre outras, na batalha de Monte Castelo. Era um defensor da democracia, cristão, republicano e liberal e, também, ferrenho anticomunista, mas não do tipo fanático e ignorante, por isso não foi persuadido pela descabida acusação dos golpistas contra o estancieiro João Goulart, o vice-presidente trabalhista. Não simpatizava com o governador Brizola, mas, devido a seu histórico perfil legalista, preferiu ficar ao lado dos que defendiam as regras estabelecidas pela Constituição de 1946. Por tal motivo, comunicou o ministro da Guerra: “cumpro ordens apenas dentro da Constituição vigente”. Para Brizola, em reunião no Palácio Piratini, disse: "Governador, estou aqui para informar-lhe que o comandante do IIIº Exército e os demais oficiais decidiram ficar com a Constituição e garantir a posse do presidente João Goulart".

Como o IIIº Exército era o que possuía o maior contingente armado do país, a Campanha da Legalidade passou a contar com um grande poder militar somado à Brigada Militar, o que deixou claro para os golpistas que a guerra civil passava a ser uma peça importante no tabuleiro. O jogo pegou preço e a balança pendeu para a causa da Legalidade, sem volta. O resto é história, que nos informa que o Exército do Brasil possui em sua biografia uma vocação legalista e um compromisso com o texto constitucional que é insofismável. mesmo que conviva com pretensões golpistas de grupos internos radicais de tempos em tempos.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 26/08/2021
Alterado em 26/08/2021
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