João Adolfo Guerreiro
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Os Desajustados

Em 1º de fevereiro de 1961 uma crítica na revista Variety dizia ser "um labirinto complexo de conflitos introspectivos" o filme Os Desajustados, lançado no final de janeiro daquele ano. O que uma obra de 60 anos atrás pode nos informar nos dias atuais?

Os Desajustados ficou famoso na história do cinema por ser o último filme dos astros Clarke Gable e Marilyn Monroe: ele teria um ataque cardíaco em novembro de 1960, dias após o encerramento das filmagens; ela faleceria em agosto de 1962. Um filme ambicioso, dirigido pelo renomado John Huston e escrito por Arthur Miller - então marido da diva -, era o primeiro trabalho dramático de Monroe como protagonista, fugindo do estereótipo "loura burra simpática e sensual" das comédias. Gable gostou tanto de participar que disse pouco antes de morrer que foi o seu papel mais importante depois do icônico Rhett Butler de E o Vento Levou.

Produzido originalmente em preto&branco, conta a história da recém divorciada Roslyn (Monroe), do veterano cowboy Gay (Gable), do ex-aviador e mecânico Guido (Eli Wallach), do cowboy Perce (Montgomery Cliff) e da idosa Isabelle (Thelma Ritter). Todas as personagens possuem uma história de vida problemática, com casamentos falidos e dificuldades familiares, buscando lidar da melhor forma possível com a situação: são sobreviventes. E é aí que Os Desajustados nos traz reflexões possíveis para os dias de hoje.

A principal delas é: até onde é desajustado aquele que não se ajusta a uma sociedade doente, ela mesma desajustada do que seria o ideal de uma sociedade saudável? Nesse sentido, a personagem de Marilyn é o centro crítico do filme, ao tensionar os demais com a sua visão do que deveria ser o certo nas relações sociais e individuais: sinceridade, lealdade, respeito e humanidade. Confrontados por Roslyn, Gay, Perce e Guido começam o processo de reflexão que leva ao estranhamento e à desnaturalização de suas escolhas e atitudes na vida. Muito bom, gol de placa de Miller. Se eu contar mais do que isso estrago o prazer de quem ainda não assistiu.

No mundo atual, onde as pessoas funcionam para a economia e não o contrário, a vida humana é objetificada como mercadoria de valor relativo e, devido à evolução tecnológica do processo produtivo, cada vez mais prescindível em termos quantitativos - a força de trabalho humana se tornando desnecessária. No tempo e espaço onde a vida da maioria não é prioridade, onde está o problema? Nos "desajustados", nos que sobram, nos excluídos ou na sociedade? É, basicamente, uma culpa individual ou social? Até onde o indivíduo pode e deve reagir a uma estrutura social que lhe é inóspita, buscando alternativas de sobrevivência, por um lado, e dizendo "não" à estrutura, por outro? São questões velhas que voltam com dramaticidade à pauta.

Os Desajustados apenas tangencia as questões sociais, pois as coloca como pano de fundo para os dramas pessoais. Não esqueçamos que, em 1960, a realidade do mundo do trabalho sobre a qual Miller enquadrou sua história era outra. Na imagem acima, estão: sentados, Marilyn e Cliff; apoiados, Gable (camisa marrom) e Wallach (boné); e em pé Huston (camisa azul), Miller (camisa branca) e o produtor Frank Taylor. Recomendo o filme.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 01/02/2021
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