1º de janeiro de 2021
Crônica publicada dia 1º de janeiro de 2021 no site do jornal Portal de Notícias.
A imagem acima tem uma história interessante. Viralizou nas redes sociais, poucos anos atrás, como sendo de uma menina Síria, que esboçou o expressivo, inusitado e ambivalente sorriso a pedido de um fotógrafo. Não foi exatamente assim.
A menina, na verdade, era iraquiana e estava fugindo com a família de Mosul, então ocupada pelo Estado Islâmico, e que sofria uma forte ofensiva de retomada pelo exército do Iraque. O fotógrafo de guerra que a fez, Ali al-Fahdawi, recorda que estava fotografando o avanço, ela passou com sua família, que logo seguiu seu caminho e eles não trocaram palavra. Ali confirmou que a foto foi tirada em 16 de março de 2017 no seguinte contexto: “Eu estava na batalha com o Exército na linha de frente, e esta menina estava fugindo com sua família do bombardeio, indo na nossa direção, e na foto estava chorando. Quando ela me viu, eu sorri um pouco e no rosto dela havia um sorriso e tristeza. Foi o momento decisivo para tirar a foto. Esta menina com sua família escapou das forças do EI por uma estrada sinuosa e enlameada entre as colinas, sob um mau tempo e forte chuva. A menina caminhou 40 quilômetros por dois dias com os pés descalços”. Nesta data, mais de 150 mil pessoas fugiam de Mosul. Anos depois, se reencontrariam.
Uso a imagem nessa primeira crônica do ano por ver nela um sentido de humanidade e esperança na adversidade que é justamente a força que precisamos para nós nesse 2021 que hoje inicia, a fim de superar essa situação limite pelo qual já passamos por dez meses no Brasil. As armas para isso serão vacinas, seringas portadas por médicos e enfermeiros, não por soldados. Nossa guerra atual é diferente, não gera refugiados, mas isolados que, de maneira inversa, refugiam-se do perigo ficando dentro de suas casas. "Fique em casa", em vez de "fuja".
Lembrei da menina porque a esperança é uma criança reagindo com um sorriso ao horror da guerra ou outra brincando alegre num balde d'àgua durante uma pandemia no último dia do ano, alheia ao drama que assola o planeta em que vive. Uma vida nova, um ano novo, o processo que reinicia a cada 1º de janeiro, simbolicamente.
Muita saúde, amor e paz para todos nesse ano que inicia. Cuidem-se e fiquem com Deus.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 31/12/2020
Alterado em 01/01/2021