João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Sem isolamento social?!?!

Aqui nessa tarde de quinta-feira, sentado à sombra da árvore na frente da minha casa, observando rigidamente a quarentena, assito o movimento nas ruas. Até quarta ele ainda estava pouco, mas agora, depois da fala do presidente e da flexibilização nos decretos dos governos estadual e municipal, parece que o pessoal está se sentido liberado, com coragem de sair à rua. É o que vejo, quando estou confinado nesse meu pequeno pedaço de mundo no centro da cidade.

Fora aqueles que estavam todos os dias por aí zanzando, agora enxergo muitos jovens risonhos, confiantes e saudáveis, e carros. E, pasmem, muita gente de idade. Quase ninguém com máscara. Para dizer a verdade, nessa tarde de quinta-feira, apenas duas pessoas, que passaram de carro em momentos distintos. Uma delas é um amigo e parou o carro para me cumprimentar, informando que ia num ateliê comprar máscaras. Uma senhora que mora aqui perto, que sei que tem 70 anos e é diabética e cardíaca, saiu para comprar pão hoje pela manhã e, umas duas horas depois, foi pagar uma conta. Passou por mim e deu bom dia, muito simpática. Um veterano teve na casa dela hoje e, também, uma amiga. Sua filha mais nova passa o dia inteiro na rua, entrando e saindo de casa, despreocupadamente. Ou não, vai ver é o jeito dela segurar as pontas, já que tem uns 50, né. Todavia, penso que ela arrisca a mãe agindo dessa forma. Já outra senhora que conheço, em situação inversa, está isolada em casa como num bunker, só uma filha vai lá e deixa as coisas para ela na porta, que ela esteriliza e leva para dentro. Como tem uma penca de filhos, creio que, assim, ela se mantém até o Carnaval de 2021.

Pela manhã cedo também olho uma senhora, deve ter também uns 70, que eu sei que é viúva, sem filhos e mora sozinha. Vai no supermercado fazer compras, no horário destinado a idosos e pessoas com doenças do grupo de risco. Que sorriso bonito e vivaz possui, também sempre me cumprimenta afetuosamente. Que escolha ela tem, não é mesmo, a não ser enfrentar esse mundo agora letal para ela? Que coragem digna tem essa mulher. Deus a proteja.

Percebo que em cidades, estados e no país, o interesse pelo econômico está prevalecendo sobre o da vida na mentalidade de muitas pessoas. O grande público alvo da morte, os "10%", idosos e portadores de algumas doenças, são justamente os que, se o sistema de saúde saturar, serão preteridos no tratamento vital possível (respirador) em favor dos mais jovens e saudáveis por ela gravemente acometidos, pois esses últimos, com mais chances de sobrevivência, serão priorizados, que foi o que ocorreu na Itália. Serão os cinco ou sete mil que morrerão, nas palavras do senhor Madero. Uma Geral do Grêmio inteira de gente morta. Tétrico e monstruoso, na minha opinião. O senhor Madero se desculpou e disse que foi mal interpretado, num vídeo que está rolando no You Tube. Disse que deseja flexibilizar o isolamento para os pequenos empresários não se verem sem dinheiro e desprotegidos. Longe de mim condená-lo numa hora dessas, creio que ele não foi feliz mesmo, não consigo imaginar uma pessoa com a responsabilidade social dele pensar de verdade isso. Não que não tenha gente que não o pense.

Aqui no Portal de Notícias, vi uma postagem sobre o primeiro caso de morte registrado no RS pela Covid-19. Uma senhora de 91 anos. Ali sim, um pessoal, na maioria jovens, veio e fez comentários igualmente monstruosos. Comentários ironicos, faziam piada, riam. Mas o que é isso? Tralalá que gente é essa? Que Deus os perdoe, pois, como disse Jesus na Cruz, eles com certeza não sabem o que fazem. Esse fato marcou-me não só pelo macabro da situação, pois os comentários centraram-se na idade da senhora, que ela morreria com qualquer gripe mesmo. Sabe, minha tia-avó e madrinha morreu aos 101 anos, caminhando, falando e escutando, lúcida. Assim, quem pode garantir que, sem o contágio da Covid-19, ela não ultrapassaria a tia Ná? Na minha família tem muita gente de idade, vítimas potenciais dela.

Sinceramente, espero estar errado, mas, sem isolamento social, vai ser muito difícil controlar a propagação de um vírus com essa capacidade de disseminação, pelo que se observou até agora em outros países. Como assim, liberar as escolas? Resolver a propagação só com protocolos, álcool gel, água e sabão? Que eu e alguns outros, como o deputado Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, estejamos todos errados, e que o clima quente daqui evite uma nova Itália. Maia, defendendo a continuidade do isolamento social, disse em entrevista ser os investidores da bolsa, que estão perdendo dinheiro, a pressionar o governo federal. Para ele, os investidores devem correr seus riscos financeiros, não o povo correr risco de vida. Concordo. Falou mais ainda: "O que está faltando hoje para os brasileiros, para todos, é previsibilidade. Se o governo já tivesse resolvido a renda dos brasileiros mais simples, uma política de isolamento dos idosos nas cidades, se o governo já tivesse garantido a renda do emprego daqueles que ganham até cinco salários-mínimos - o teto do INSS, nós já teríamos garantido previsibilidade para a maioria dos brasileiros e com isso, todos estavam fazendo o isolamento, esperando os impactos da chegada do vírus e a cada semana avaliando o que deve ser feito". E isso vem de encontro também à preocupação do senhor Madero com os pequenos empresários. Não há como ignorar esse realidade econômica, mas também não tem como abrir mão do isolamento em questão de vida ou morte. Na rua, apenas os profissionais de setores chave para que o país não pare, todos muito bem protegidos e nenhum deles dentro dos gupos sociais de risco. 

O que eu mais achei pertinente na fala dele foi: “Pedir uma liberação vertical sem a gente ter feito uma operação de guerra para proteger os idosos que vivem em várias comunidades, em todos os estados, me parece uma decisão focada em algo que não está sendo bem elaborado, bem construído e que não há uma preocupação com esses brasileiros que vivem em ambientes pequenos, com muitos parentes, muitos jovens, que certamente saindo para trabalhar voltarão para suas residências e contaminarão milhares de idosos brasileiros”. Exato. É um pouco o que eu tenho observado daqui do meu pequeno pedaço do mundo. Não vou citar aqui, mas ele faz algumas propostas econômicas com as quais concordo e que vocês podem conferir procurando no Google.

Muitas pessoas, no quadro em que estamos, não terão como se isolar. A saída seria proteger a economia, ou seja. o salário e o lucro das pessoas, de outras formas, como Maia propôs, mas não relaxando agora o isolamento social (e perdendo quiçá a única chance de reduzir muito a disseminação), o que vai afetar justamente a saúde e a vida dos mais pobres, sem condições financeiras de se proteger adequadamente. O pessoal das favelas, só para citar um exemplo.

O que dizer? De minha parte, que continuem se cuidando e só saiam pra rua em caso de extrema necessidade. Sejam solidários a altruístas.

Que Deus ilumine a todos.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 26/03/2020
Alterado em 26/03/2020
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