Seu Walter foi na Arena aos 88
Ontem era o último jogo do ano na Arena Grêmio. Gilmar e seu filho Matheus resolveram que era o momento de levar o pai e avô, Walter Oliveira, para conhecer o novo estádio do seu time do coração.
Só não pensem que o seu Walter, surpreendentemente lúcido e ágil aos 88 anos, é cristão novo no futebol. Não, mas claro que não. Ele foi no jogo inaugural do Olímpico, em 1954, aos 23 anos (coindidentemente a mesma idade de seu neto), quando ainda morava em Butiá, onde trabalhava como mineiro e tocava acordeon nos bailes junto com seu irmão Waltério, encantando moças como Iolanda, 12 anos mais jovem, sua esposa. Naquela cidade, antes de vir para Charqueadas, onde reside há décadas, levava os filhos para assistir aos confrontos entre Brasil e Butiá, eis que torcedor do primeiro. E gremista, sempre gremista.
Seu Walter ficou encantado com a Arena. E a Arena com ele. Seu neto publicou as duas fotos acima no Twitter, e elas tiveram 1k de curtidas, além de 100 compartilhamentos, 37 mil visualizações e 7 mil interações. Conversei com o seu Walter durante o Grêmio 2x0 Cruzeiro. Ele é a segunda pessoa de Charqueadas que foi no primeiro jogo do Olímpico com a qual eu já falei. A outra foi a saudosa dona Loivaci, da Banca do Povo. Pois bem, seu Walter, falando com sua voz calma e pausada, recordava do placar, 2x0, do time, o Nacional do Uruguai, e do goleador, Zunino, atacante uruguaio que jogava no Grêmio. Zunino estava, sim, naquele jogo, mas quem marcou os gols do Tricolor foi o centroavante Vítor.
Na verdade, há 65 anos, aquele longínquo Grêmio 2x0 Nacional era a primeira partida do Torneio Inaugural do Olímpico, do qual participaram também Liverpool do Uruguai e o Internacional dos tempos do famoso Rolo Compressor. O Grêmio fez 4x0 no Liverpool, mas depois levou um sacode daqueles do rival local, 6x2, ficando o Inter de Larri e Bodinho com o título. Zunino marcou dois gols no torneio, um contra o Inter e outro contra o Liverpool; assim, não sei o que traiu a memória do seu Walter naquela partida. A aparência dos atletas é que não foi. Embora os dois usassem bigode, o uruguaio era branco e media 1m70cm, enquanto o brasileiro era negro e chegava a 1m87cm.
Em 1954 eram 38 mil pessoas a lotar o Olímpico ainda sem o segundo anel, que somente seria concluído em 1980, por outro gremista que lá também se encontrava, Hélio Dourado. Ontem, estiveram na Arena 20 mil pessoas, estádio com capacidade para 55 mil torcedores. Hélio Dourado não estava lá, pois faleceu aos 87 anos, em 2017. Era contemporãneo do seu Walter. O primeiro nasceu em março de 1930, o segundo em janeiro de 1931, mês que vem fará 89 anos. Zunino, Vitor, Bodinho, Larri, todos também já se foram. Assim, seu Walter é a história viva, testemunha ocular daquele fato importantíssimo na vida centenária de seu time.
Vida longa, seu Walter, gremista, mineiro e gaiteiro do Butiá.
Texto publicado no site do jornal Portal de Notícias: https://www.portaldenoticias.com.br/colunista/53/cronicas-artigos-joao-adolfo-guerreiro/