João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Textos
Supernatural

Tem coisas que a gente não pode fazer quando criança e que, adultos, fazemos. Não, não estou falando de sexo (nem pensava nisso na época, oras), estou falando de assistir DVD’s.

Em primeiro lugar, nem tinha DVD no meu tempo de guri, na década de 1970. Só TV em preto&branco. No meu caso, uma Teleotto válvulada (tenho a impressão que já escrevi sobre isso aqui, porém não importa, vou escrever de novo mesmo assim, sempre sai um pouco diferente). Em segundo lugar, DVD já está até ultrapassado: agora o lance é Blu-ray. Mas eu, como sou “das antigas” (eh eh eh eh), ainda compro e alugo DVD. De séries e filmes de TV, antigas e atuais. Antigas mesmo, tipo fossilizadas, como Perdidos no Espaço, Viagem ao Fundo do Mar, Roy Rogers e Ultraman. E atuais, tipo Supernatural.

Vi pela primeira vez no SBT, de madrugada. Em resumo, são dois irmãos que matam seres do outro mundo que matam seres do nosso mundo, ou seja, a gente. Fantasmas assassinos. Serial killers do além. Um barato, eu me divirto. Eu alugo e olho. Voltei da praia e meu passatempo atualmente é abrir as janelas, ligar o ventilador (não gosto de ar condicionado) e assistir Supernatural. Estou no meio da quinta temporada.

Eu... (ah, lembrei, escrevi sobre isso numa crônica chamada Facilidades Tecnológicas – fui conferir: foi em setembro do ano passado, mas está ficando diferente). Bom, onde eu estava? Ah tá, como ia dizer, eu justamente não consigo ficar indiferente às facilidades de hoje. Poder assistir a uma série de TV completa, no horário em que se quer e na ordem em que se deseja, é algo que eu não imaginava ser possível nos anos 1970. Era algo praticamente “supernatural” (em inglês, supernatural significa “sobrenatural”) naqueles dias. Hoje é super natural. Natural demais. Trivial. Prosaico. Comum. Corriqueiro.

Gosto dessa palavra, assim, escrita junto: supernatural. Acho mais classuda que sobrenatural. Sempre achei feia essa palavra: sobrenatural. Parece que a gente fala de coisas que estão sobre a gente. E elas estão acima da gente, simplesmente, não sobre. Para algumas religiões, essas coisas também estariam entre e sob nós. O que só torna essa palavra, a meus olhos, mais inadequada ainda. Tá, confesso: eu não gosto da sonoridade dela, estou implicando. Já supernatural parece música da Sade ou poesia de Mário Quintana e Fernando Pessoa. Assim eu sinto. Pura subjetividade minha. E subjetividade é como gosto, cada um tem a sua e não se discute, tipo gostar de Bolsonaro ou de Maria do Rosário.

Supernatural me lembra “superestrutura”, que é um conceito clássico da escola sociológica marxista. Superestrutura se refere ao mundo idéias, cultural e ideológico, que fica acima da estrutura econômica da sociedade, que seria a base, isto é, as idéias viriam dela. Marx inverteu o método dialético do filósofo Hegel ao dizer isso, colocando-o, no seu entender, com os pés no chão, eis que se encontrava de cabeça para baixo ao priorizar o mundo das idéias. To simplificando, claro.

Entretanto, filosofia a parte, legal poder fazer o que se gosta, não é mesmo? Passar o tempo para além (?) do trabalho numa boa, fazendo algo que a gente curte e que nos dá prazer (não esqueçam: não estou falando de sexo). Estimulando o ócio criativo, como diria Domenico De Masi. A propósito, abri o jornal de hoje (estou escrevendo quarta-feira, são 16 horas agora) e li: “Planalto tenta conseguir apoio para reformar a Previdência”, ou seja, no futuro todos se aposentariam só por idade, aos 65 anos... Hoje, a expectativa de vida é de 75 anos e, sabemos, está difícil arrumar emprego depois dos 60, logo... Super natural isso. E mais aterrorizante que o sobre ou o supernatural!

Bom, vou nessa. Vou tomar um café e depois terminar de assistir a quinta temporada de Supernatural. Não dá medo como ler os jornais; ao contrário, diverte e relaxa. Até sexta que vem. Fui.


Texto publicado nas versões impressa e online na seção de Opinião do Jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 23/02/2016
Alterado em 23/02/2016
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