João Adolfo Guerreiro
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Esses dias, procurando filmes com áudio e legendas em francês, encontrei à venda na Babushkas um chamado Monsieur N (2003), que tratava dos últimos anos de vida de Napoleão Bonaparte durante seu exílio na ilha de Santa Helena. Interessante o filme. Depois, passando pela Garatuja, achei o livro Napoleão. Tamanho grande, capa fofa, o interior todo ornado com imagens de belas pinturas sobre o grande vulto histórico e com vários fac-similes de cartas e documentos do mesmo. Não resisti: comprei.

Lembrei da canção de Caetano Veloso: “Os livros são objetos transcendentes Mas podemos amá-los do amor táctil, que votamos aos maços de cigarros”. Bem isso, “amor táctil”. Quem gosta de livros, entende. Não é só pelo conteúdo, mas também pelo objeto, por sua concretude, sua facilidade de uso para a leitura. Basta por si, só necessita da luz do sol para ser utilizado.

Essa semana passei na Biblioteca Pública Municipal Profª Vera Maria Gauss para ver a Exposição Tradições Gaúchas (com 22 banners de Paixão Cortes sobre o tema folclore) e o Jornal Folha da Tarde de 24 de agosto de 1954 com a notícia do suicídio de Getúlio Vargas. Estando ali, dei uma olhada em alguns livros legais que os bibliotecários me mostraram. Dois chamaram minha atenção: um de 1913, de Euclides da Cunha, e outro de Vianna Moog, de 1959.

Livros antigos tem história. São objetos que geralmente passaram pelas mãos de várias pessoas e, em suas páginas, costumam guardar alguma marca desses. recordo, a propósito, do filme O Violino Vermelho (1998). Fala de um violino perfeito, uma obra de arte e, ao mesmo tempo, instrumento de expressão artística. Começa por sua construção no século XVIII e mostra sua história pelos 300 anos seguintes. Um filmaço, dos mais legais que já vi, dá para achar nas locadoras, recomendo.

“Á Marjen da Historia”, de Euclydes da Cunha (foto acima), é, proporcionalmente, um “violino vermelho”. Começa pela grafia: já no seu título, a crase “invertida”, o uso do J em lugar do G, a paroxítona (história) sem o acento e o nome do autor com Y em vez de I. Um objeto totalmente vintage. Publicado há 101 anos pela Livraria Chardron de Lello & Irmão editores, da cidade do Porto, em Portugal, trata-se da segunda edição da última e póstuma obra do autor de Os Sertões.

Na “pajina” (proparoxítonas também não são acentuadas no livro) 401, o “Esclarecimento” traz um trecho de carta enviada aos editores por Cunha, de 24 de julho de 1909, onde o autor comenta sobre a correção do texto. “Aceital-a por coerência”, aparece escrito, apenas mais um exemplo da grafia de antanho. Outro detalhe interessante vemos logo na “pajina” 7: a assinatura de “Plinio P. Alves 1913”. O exemplar, de capa dura, levemente atacado por traças e com as páginas internas amarelas, foi adquirido, provavelmente pelo senhor Plinio, em Porto Alegre, na Livraria Americana – Cunha, Rentzsch & Cia – Andradas, 363, no ano de seu lançamento.

A novela Uma Jangada Para Ulisses, de Vianna Moog (foto abaixo), publicada pela Editora Globo, apresenta marcas mais evidentes de seus prováveis donos. “Doação de Jerônimo Vianna em 15/07/14”, aparece escrito à caneta azul em sua primeira página, bem acima. Uma aquisição recente da biblioteca. Na mesma página, escrito em tinta preta, na diagonal, está uma dedicatória do autor: “Para o querido (ilegível), com um apertado abraço de seu firme admirador. Vianna Moog, (ilegível) 1959”. O exemplar, logo, deve ter sido comprado num evento de lançamento por uma pessoa muito próxima de Moog, da qual só consegui ler as iniciais do nome, G e V.

Em várias de suas páginas aparecem marcações à lápis e a canetas de cor azul e vermelha, destacando partes do texto ou escrevendo o nome de alguns outros autores. Destacam-se também uma “orelha” proposital, que marca a página 151, e outra, que marca a página 140, que foi posteriormente desmarcada. Um de sues donos, provavelmente, estudou o livro ou utilizava frequentemente citações dele.

Escrevi uma vez, há muitos anos: “Nunca fui muito de carnaval, preferia ficar lá em casa, lendo os livros que estavam ali, me convidando para uma jornada Muitas letras e emoções, imagens brotando de hábeis palavras, muito bem trabalhadas”. Livros. Quem gosta, entende.


Texto publicado na seção de Opinião do jornal Portal de Notíciashttp://www.portaldenoticias.com.br


João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 11/09/2014
Alterado em 13/09/2014
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