Vai ter Copa?
Bom, a Copa do Mundo Fifa 2014 no Brasil já está acontecendo. Como era previsto, os protestos contra esta não tiveram o mesmo apoio popular de junho de 2013, visto que a classe média, que engrossou em grande parte no ano passado as mobilizações contra o aumento das passagens dos ônibus municipais, dessa vez ou ficou em casa assistindo a Copa pela TV ou foi aos estádios.
Também contribuiu para isso, a meu ver, a insistência de setores dos grupos de esquerda não alinhados ao governo federal, que estão à frente das mobilizações, na depredação como tática de mobilização política. A classe média, claro, não está por essa de apanhar da polícia militar. Por seu lado, ela vai aos estádios se manifestar à seu modo, ou seja, vaiando a presidente e mandando-a “tomar...”, para vergonha da imprensa nacional e escândalo dos turistas estrangeiros, que devem pensar: se a elite média desse país se comporta assim nos estádios, imagina só o restante da população...
O restante da população, que não tem dinheiro para comprar ingressos para uma Copa do Mundo, não vai a estádio e tampouco a protesto. Como é o público-alvo mor das várias políticas sociais que sustentam o atual governo já no terceiro mandato, supõe-se que seja a favor da Copa e a base eleitoral da presidente Dilma. Essa nova classe C, aparentemente, está cuidando muito bem do prato em que come e que lhe está garantindo a ascensão social.
Assim podemos concluir que o ex-presidente Lula, quando achou que fazia um gol de placa ao garantir a realização da Copa do Mundo no Brasil, fez, ao contrário, um baita gol contra o seu próprio time político. Quem está abraçando o prejuízo é a atual presidenta. Lula ainda teve a grande ideia de, em vez de organizar oito sedes para os jogos, conforme exigia a Fifa, propor doze, a fim de levar o espetáculo para todo o povo brasileiro...
Essa Copa está sendo um grande aprendizado para a nossa nação, e um dos ensinamentos mais óbvios e que salta aos olhos é o fato de um evento como esse não ser voltado para todo o povo, mas somente para a parcela desse que pode pagar para ir aos estádios. Assim, Lula e Dilma acabaram gastando muito para fazer uma festa para a classe social que, em sua maioria, não gosta deles nem do seu partido, que não vai votar na reeleição do atual governo e que berra em altos brados nos estádios: “Ei, Dilma, vai tomar...”.
Ao modo brasileiro, o que estamos vendo nessa Copa é uma versão do que acontece na Venezuela, por exemplo. Só que lá a coisa é mais aguda devido aos governos de Chaves e de Maduro realizarem uma política de enfrentamento aberto de classes, confrontando a classe média de seu país, a elite econômica, os partidos de direita e a grande mídia de forma ostensiva. Aqui, os governos do PT fazem uma nítida conciliação de classes, articulando com segmentos políticos, econômicos e sociais tradicionais visando garantir a governabilidade, num modelo que nitidamente deu certo até hoje. A Copa não deixa de ser uma faceta desse modelo, embora esteja dando um resultado contrário ao esperado.
Por se dar em um ano eleitoral, a Copa está sendo extremamente politizada. A grande mídia, nitidamente comprometida com uma alternativa pela direita na eleição, se apropria do discurso da esquerda que protesta nas ruas por mais Saúde e Educação para bombardear sem tréguas o governo, mesmo ganhando, por seu lado, uma nota preta com a realização do evento. E, pelo decréscimo da atual presidente nas pesquisas, verificado de fevereiro para cá, parece que vem acertando o alvo.
Terça-feira que vem continuo nesse assunto.
Texto publicado hoje na seção de opinião do jornal Portal de Notícias.