João Adolfo Guerreiro
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Foto: Manifestação em Charqueadas - www.portaldenoticias.com.br

V de “Vem pra rua!”

Hoje eu iria escrever uma segunda parte para o texto da semana passada, “Policiais Truculentos x Estudantes Baderneiros”, onde eu tratava dos fatos da quinta-feira, dia 13, onde estudantes foram fortemente reprimidos em São Paulo. Entretanto, veio a segunda-feira, 17, e o meu texto já saiu na terça ultrapassado pelo trem da história, que gerou uma mobilização popular como há vinte anos não se via no Brasil, uma verdadeira avalanche de democracia e de cidadania, que varreu capitais, grandes cidades a grande parte dos municípios brasileiros, inclusive os da nossa região.

Depois da semana ímpar que vivemos, entendo que ficou claro para todos o que eu escrevi, que policiais e manifestantes eram os mariscos dessa situação e que os verdadeiros responsáveis eram outros. Tudo está mais claro agora. A magnitude dos protestos pegou todos desprevenidos, o “Vem (vem) Vem (vem) / Vem pra rua vem! / Contra o aumento!” cresceu para muito além do seu mote originário, o aumento das passagens de ônibus. Todos os principais fustigados pelo protesto (governos municipais, estaduais e federal, grande mídia, Judiciário, parlamentos, políticos em geral, partidos, sindicatos, bancos) ficaram sem ação ante a expressiva participação de jovens de 15 a 25 anos num movimento novo, horizontal, sem centro definido e com um mosaico de motivações que se agregaram no processo.

O paradigma brasileiro na leitura desse tipo de fato social remete ao movimento das Diretas Já (1984) e ao Fora Collor (1992), que tinham características diferenciadas, eis que reuniam pessoas de diferentes faixas etárias organizados por partidos políticos e sindicatos e os governos eram hegemonizados pela direita, principalmente o federal. O “movimento por 20 centavos que não é só por 20 centavos” reúne uma maioria absoluta de jovens, organizados horizontalmente pela tecnologia virtual de relacionamento chamada rede social, é avessa aos partidos e sindicatos e temos um governo de esquerda no poder máximo da nação, apoiado por uma ampla aliança de centro.

Nesse sentido, vejo muito mais similaridades do movimento de hoje no Brasil com o Maio de 1968 na França. Começaram de forma muito semelhante e são basicamente movimentos com base estudantil. Na França, nos ideologizados anos 1960, uma querela estudantil na Universidade de Nanterre, reprimida duramente pelo governo, foi o estopim para tudo. Aqui, foi o governo paulista que na quinta-feira 13 determinou a sua Polícia Militar que agisse fortemente contra a passeata estudantil, fato que gerou uma comoção nacional e desembocou na avalanche popular da segunda-feira 17, data que fará parte dos livros de história que ainda serão escritos.

A diferença entre os dois movimentos é que a juventude francesa de 1968 era movida por utopias e ideologias e partidos e sindicatos eram vistos como instrumentos confiáveis para canalizar e levar adiante a luta política, que inclusive necessitava desses instrumentos. Hoje não, os jovens possuem a tecnologia das redes sociais para se auto-organizarem nacional e internacionalmente, sem intermediários; as utopias e ideologias políticas se encontram em baixa. Mais: a direita estava no poder na França em 1968.

O curioso do movimento brasileiro, e isso ficou claro durante essa semana que passou, é que ele foi organizado inicialmente por militantes políticos e organizações populares ligados a partidos de esquerda fora da aliança governista federal (embora oriundos da mesma matriz que o PT) em colaboração com grupos anarquistas, e se dirigiam, logo, aos governos municipais, que autorizam o aumento das passagens, e aos estaduais, que controlam as polícias militares.

Hoje a leitura do movimento está em “disputa” entre a esquerda acossada no poder e a direita sedenta fora dele Recomendo, para uma melhor compreensão, a leitura do blog do jornalista e historiador gaúcho Juremir Machado da Silva, principalmente o texto “Hipóteses sobre as manifestações” e a entrevista com o sociólogo francês Michel Maffesoli. Assistam também ao filme “V de Vingança”, de 2006, paradigmático! Semana que vem volto ao tema.

Texto publicado na seção de Opinião do jornal Portal de Notícias.


Foto : Claudinho Silva - Charqueadas

João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 27/06/2013
Alterado em 27/06/2013
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