A foto do cronista
Na noite de 29 de outubro de 2008, uma quarta-feira, às 20 horas, o jornalista e cronista David Coimbra esteve no Solar Shopping como palestrante do IV Sarau Literário de Charqueadas, participação viabilizada pela extinta Escola Cenecista Carolino Euzébio Nunes. Reproduzo aqui uma nota saída na imprensa local sobre ela:
“DAVID COIMBRA – A vice-prefeita de Charqueadas deu um puxão de orelhas no cronista de ZH durante o IV Sarau. Motivo: um comentário dele sobre mulheres, não muito feliz. Fez certo a vice. Mas o cara é tri gente fina, simpático, educado e gremista, merecendo o sucesso advindo do seu inegável talento. Disse algumas coisas legais, mas por se dirigir mais ao público jovem, fã do “Pretinho Básico”, sua fala ficou aquém da expectativa dos literatos, professores e jornalistas locais, que esperavam um conteúdo bem mais denso”.
Leitor de Coimbra, de comprar livros e guardar sua coluna de jornal, incluo-me nesses que tiveram sua expectativa frustrada, não pela qualidade ou talento do palestrante, mas pela forma como foi conduzida a fala. Pudera, como o público presente era o da escola, jovens ouvintes da Rádio Atlântida, hoje acho que o cronista agiu certo. Lembro que ele fez uma crítica a leituras dos antigos clássicos da literatura com os quais se trabalhava nas escolas, como Machado de Assis, pela linguagem ultrapassada. Fiz uma intervenção no sentido de defender o Bruxo de Cosme Velho, dizendo que suas crônicas ainda eram deliciosas de ler e que soavam muito bem ainda hoje, mesmo sendo centenárias, devido ao estilo leve.
Todavia, reconheço que Coimbra sempre foi uma de minhas influências, principalmente pela forma, pois escrevia muito bem, excelente cronista, dos melhores. Discordava de alguns de seus conteúdos, logo era uma referência em dois sentidos: no de seguir e no de não seguir alguns de seus caminhos. Dentre muitas coisas, recordo-me de seu embate com outro genial cronista auto declaradamente gremista, o Paulo Sant’Ana, que explodiu num bate-boca pela rádio Gaúcha, no programa Sala de Redação. Coimbra, com seu prestígio e estatura, saiu ileso, sorte que Kenny Braga e Wianey Carlet não tiveram, sendo demitidos da RBS por brigarem com Paulo. Hoje, Sant’Ana, Carlet e Coimbra estão no céu, e essas coisas não importam mais em nada.
Como serão lembrados? Em sua penúltima crônica em ZH, “Pulei fora dos 60”, do dia 24, terça-feira, David falava de seu recente aniversário e sobre isso: “Se você for escrever a biografia de alguém, qual é a foto que será publicada na capa do livro? Essa é a foto que representa a vida da pessoa, era ali que ela deveria ter ficado para sempre”. E arrematou: “Oh amigos, resta-me pouco. Então não vou me importar com o que não tem importância. (...) Mais tarde, quando eu deixar de existir, vocês decidem que foto fui eu”.
Ainda na semana passada escrevi sobre ele no Portal (Às vezes ninguém vê quando tu choras), acerca de sua crônica do dia 16, “Quando quis morrer”, onde abordava seu sentimento ante os efeitos da doença em seu corpo, mas afirmava seu amor pela vida. O fato é que o Rio Grande do Sul está em pesar pela sua morte, uma grande perda jornalística e literária, ainda jovem para um escritor. Um cara muito importante, conhecido e respeitado aqui do nosso Estado. Acho que essa será a sua foto: a dele sorrindo, no auge de sua forma física e literária, do período de quando esteve aqui em Charqueadas, no Sarau. É o que penso.
Meus sentimentos aos familiares, amigos, colegas e leitores.
Coimbra foi grande homem de letras, um baita cronista.