João Adolfo Guerreiro
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Meu Diário
03/08/2010 10h31
O herói de Pinto Bandeira (jornal ZH, 31.07.10)
O João Feliciano é um cara daqui da região, de São Jerônimo, conheço ele há um bom tempo. Legal ver ele assim numa boa, sempre foi um cara comprometido politica e socialmente.
Retirei essa matéria da Zero Hora de domingo.


Os moradores vão se apaziguando, enquanto os pessegueiros florescem na paisagem de Pinto Bandeira, um lugar traumatizado por uma divisão que rachou a população ao meio a partir de 1996, foi cidade por apenas três anos, voltou a ser vila e agora é cidade de novo.

O herói da pacificação, na terra dos descendentes de imigrantes italianos, é um forasteiro que chegou ali em janeiro de 2004 com o nome de guerra na farda.

Menezes, soldado da Brigada Militar, mediou conflitos, reanimou os moradores e agora, de terno e gravata, é o doutor João Pizzio. É o comandante da mobilização que devolveu a Pinto Bandeira a condição de município. No escritório na entrada da cidade da Serra, o advogado João Pizzio tem uma miniatura da bandeira do município sobre uma prateleira. A imagem da bandeira é também a tela de repouso do computador.

Pizzio, 36 anos, curte o desfecho de uma empreitada que iniciou quando ainda era Menezes. Desde 9 de julho, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que cassou uma liminar de 2001 contra a criação do município, mora numa cidade que ajudou a resgatar. A história de Pizzio na história de Pinto Bandeira é o roteiro do imponderável. Nas ruas, ele é aclamado como líder.

Há seis anos e meio, quando desembarcou ali, era apenas um brigadiano que pretendia mudar de cidade com a mulher, Fabiana, trocando Barra do Ribeiro por um município serrano instalado em janeiro de 2001. Mas quando chegou, em janeiro de 2004, Pinto Bandeira voltara a ser distrito de Bento Gonçalves dois meses antes. Cumpria-se determinação do STF, que acolhera liminar do PP (à época, PPB) de Bento, cassando a emancipação.

— Logo que cheguei disse ao morador Remi Da Campo que, quando me formasse, iria buscar esse município de volta — conta Pizzio, que estudava Direito no campus da Universidade de Caxias do Sul em Bento.

Antes tinha de cuidar de desavenças e pequenos furtos ao lado do soldado Roberson Aimar Amaia Lopes, que já atuava no distrito. Pinto Bandeira era uma vila traumatizada por uma sequência de perdas e desencontros. No plebiscito de 1996, a emancipação obtivera o sim de 761 eleitores, e 739 disseram não, uma diferença de apenas 22 votos.

O governador Antônio Britto (PMDB) recorreu contra a emancipação, com o argumento de que prazos não haviam sido cumpridos. O STF rejeitou a ação. Mas o município não teve eleição naquele ano e só foi reconhecido como tal em 1999, com nova lei aprovada pela Assembleia. Elegeu o prefeito Severino Pavan (PDT) em 2000 e teve a emancipação cassada pela liminar do PP um ano depois. Pavan resistiu até novembro de 2003, quando teve de abandonar o cargo. Pinto Bandeira era vila de novo.

— A população havia sentido as vantagens do município, porque investimos em saúde, máquinas, rede de água — relembra Pavan.

Com a reversão, a autoestima dos moradores foi abalada, e as desavenças políticas entre líderes locais do PP, favoráveis ao município, e do PMDB, contrários à emancipação, dividiram Pinto Bandeira. O soldado Menezes prestava atenção no imbróglio e se dedicava a estudar a confusão jurídica do caso. O distrito da uva e do vinho, com população homogênea, sem favelas, com alta renda, maior produtor de pêssegos de mesa do país, estava melancólico.

No período em que foi soldado, até julho de 2009, Pizzio viu a vila ser tomada quatro vezes por assaltantes que invadiram o posto do Banrisul e a agência do Sicredi. Era um faz-tudo na segurança. Conquistou a confiança dos moradores.

Tanto que um dia, sentado na salinha que ocupava na subprefeitura, recebeu um casal que trazia a filha de quatro ou cinco anos pela mão. O homem disse:

— Queremos que o senhor nos separe.

O soldado explicou que somente a Justiça poderia encaminhar o processo. E retomou a lida. Em casa, lia e relia tudo que se relacionava com a confusa tentativa de emancipação. Formou-se em julho de 2008 e em 6 de janeiro de 2009 criou, com um grupo de teimosos, a Associação dos Moradores Pró-Município de Pinto Bandeira, que ele preside. Passou a realizar reuniões, viajar a Brasília para contatos no STF e a mobilizar a população e os políticos. Poucos acreditavam que, nove anos depois, Pizzio conseguiria fazer com que o processo saísse das gavetas do Supremo, com vitória para Pinto Bandeira.

Emancipação ganhou apoio

Severino Ferrari, ex-diretor da Cooperativa Colmeia e presidente da Comissão de Emancipação, admite que o soldado líder chegou a ser visto com desconfiança por parte da população por ser um forasteiro. Muitos não sabiam que Menezes também é um gringo, filho de pequenos agricultores de São Jerônimo, onde nasceu, e neto de Ramão Pizzio e de Cecília Lanzarini, de Barão do Triunfo. João Feliciano Menezes Pizzio agora é conhecido como João ou como Pizzio. Também é um deles, é um oriundi:

— Esta é a minha cidade, eu sou pinto-bandeirense.

Para o empresário Gilberto Tumelero, dono de supermercado, ex-vereador pelo PMDB, é preciso reconhecer que Pizzio pacificou Pinto Bandeira e que a maioria dos que eram contra a emancipação mudou de opinião.

Avelino Vítor Detoni, 70 anos, e a mulher, Angelina, 54 anos, plantam mudas de parreira numa área perto da cidade, onde imaginam que tudo será prédio daqui a pouco, com o crescimento de Pinto Bandeira. Avelino era contra a emancipação. Mudou:

— Eu pensava: pra que ser município, se aqui sempre foi uma vila tão tranquila? Agora, sei que é melhor, que virá mais dinheiro para o município.

Angelina nem lembra se votou contra ou a favor da emancipação. Hoje, quer Pinto Bandeira como cidade. Tumelero completa:

— Agora, o que passou, passou. Devemos buscar o consenso para eleger o prefeito. Essa pessoa pode ser Pizzio.

É a opinião de Severino Ferrari (PP), candidato a prefeito em 2000, e de muita gente que circula pelo centro da cidade. O pacificador, estudante de pós-graduação em direito militar, filiado ao PT, desconversa diante do computador com a bandeira do município em que se lê "vida, progresso, liberdade":

— Hoje, mais de 85% apoiam a emancipação. Fomos humilhados por muito tempo. O que importa é que não existem mais divergências.
Publicado por João Adolfo Guerreiro
em 03/08/2010 às 10h31