João Adolfo Guerreiro
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Textos
Quando a tragédia da vida supera a da arte

Dia 16 completar-se-ão setenta anos do falecimento da escritora estadunidense Margaret Mitchell (08.11.1900 - 16.08.1949), autora do fenomenal clássico da literatura mundial ...E O Vento Levou (*). O romance, publicado em 1936, cuja épica versão cinematográfica foi lançada em 1939, foi o único livro de Mitchell, que o escreveu enquanto estava desempregada (trabalhava como jornalista), concluindo-o aos 29 anos.

Mitchel residiu a vida inteira em Atlanta, Geórgia, não por acaso a cidade e estado sulistas onde ...E O Vento Levou é ambientado, durante o período histórico da Guerra de Secessão (1861 - 1865): seu pai era advogado e diretor da Sociedade de História de Atlanta. Assim, seria lógico esperar que sua literatura relatasse o conflito do ponto de vista da Confederação dos Estados do Sul. E ela realmente o fez.

Embora crítica aos motivos e a certa ingenuidade arrogante pelos quais a classe propietária algodoeira sulista (a obra possui esse recorte social) foi à guerra, o romance relativiza claramente a escravidão nos estados da Confederação, pintando-a em tons róseos, embora não seja um texto que defenda o modelo escravagista. Nesse sentido, mesmo tratando-se de um livro publicado setenta anos após o final do conflito, ele retoma em parte  o "espírito" dos romances sulistas do século XIX, anteriores à eclosão da Guerra Civil Americana, que refutavam A Cabana do Pai Tomás (1852), de Harriet Stowe (1811 - 1896), outro retumbante sucesso editorial, mas um retrato negativo da escravidão que vicejava nas plantações de algodão, denunciando o lado sombrio da fonte da riqueza do Sul.

A autora, quando da adaptação para as telonas de ...E O Vento Levou, observou essa "herança espiritual literária" ser suavizada. Se você assistiu o filme e acha que ele de fato relativiza o que era a escravidão nos Estados Unidos, creia: no livro isso é bem mais explícito, nas situações e nas falas das personagens, não incluídas no cinema. E como a Sétima Arte é o que é, não apenas isso foi abrandado... Entretanto, é assunto para uma crônica que farei em dezembro, alusiva aos oitenta anos de lançamento do ícone produzido por David Selznick (1902 - 1965).

Mitchell enriqueceu com os rendimentos tanto do livro quanto do filme. Um detalhe curioso foi o de sua morte. No romance, a heroína e personagem principal Scarlett O'Hara, durante o feroz e apocaliptico bombardeio de Atlanta pelas tropas nortistas comandadas pelo general Sherman (1820 -1891), saiu pelas ruas da cidade tomadas por um pandemônio de pessoas a pé, a cavalo e em carroças efetuando desabalada e desesperada fuga. Por muito pouco Scarlett, seguidas vezes, não foi vítima de um acidente. Na vida real, Margaret Mitchell foi atropelada perto de sua casa, em 11 de agosto de 1949, por um automóvel. Ao contrário do livro, não havia um salvador Rhett Butler por ali, enamorado e disponível. Nesse caso, infelizmente, a tragédIa da arte foi superada pela da vida.

Todavia, assim como a inglesa Emily Brontë (1818 - 1848), Mitchell foi uma das grandes literatas de língua inglesa a se tornar célebre mesmo tendo apenas um único livro em sua carreira, escrito até os 29 anos. Não é pouca coisa.


(*) - Para quem deseja conhecer melhor a obra, recomendo duas edições  que estão na Biblioteca Pública Municipal Glaucus Saraiva, em São Jerônimo. Ambas da Hemus Editora Limitada, maravilhosas, das capas às orelhas, principalmente a de 1986, comemorativa ao cinquentenário do romance, muito bem diagramada e com pequena biografia da escritora incluída. 
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 14/08/2019
Alterado em 14/08/2019
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